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Criança, infância e cidadania: diálogos de inspiração em Paulo Freire
Child, childhood and citizenship: dialogues of inspiration in Paulo Freire
Niño, infancia y ciudadanía: diálogos de inspiración en Paulo Freire
Marta Regina Paulo da Silva*
Resumo
O presente artigo problematiza a relação criança, infância e cidadania a partir de diálogos de inspiração em
Paulo Freire. O intuito é o de apresentar as contribuições da epistemologia desse educador para pensar a consti-
tuição da cidadania da infância e a proposição de uma educação infantil cidadã. O diálogo parte dos resultados
de uma pesquisa teórica, que investiga nas obras de Freire sua compreensão sobre as crianças, as infâncias e a
educação das crianças pequenas. Em seus escritos, Freire denuncia as formas de opressão às quais estão sub-
metidos meninos e meninas e o quanto o processo educativo revela-se autoritário e antidialógico, silenciando,
assim, suas vozes. Esse autor defende as crianças como sujeitos de direitos, dentre eles o direito à palavra e à
participação, propondo que as instituições de educação infantil se transformem em centros de criatividade, nos
quais se ensine e se aprenda com alegria. O estudo conclui que a epistemologia freiriana nos remete à com-
preensão de que educação, cidadania e infância não são apenas conceitos abstratos, mas dimensões de uma
práxis crítica e criativa, que nos possibilita reconhecer as crianças como cidadãs e construir com elas práticas
pedagógicas emancipadoras.
Palavras-chave: infância; cidadania; Paulo Freire; participação; educação infantil.
Abstract
This article discusses the relationship between child, childhood and citizenship based on dialogues inspired by
Paulo Freire. The aim is to present the contributions of this educator’s epistemology to think about the consti-
tution of childhood citizenship and the proposition of a citizen education. The dialogue starts from the results
of a theoretical research that investigates in Freires works his understanding about children, childhood and the
education of young children. In his writings Freire denounces the forms of oppression to which boys and girls are
subjected and how authoritarian and anti-dialogical the educational process is, thus silencing their voices. This
author defends children as subjects of rights, including the right to speak and to participate, proposing that early
childhood education institutions become centers of creativity in which to teach and learn with joy. The study
concludes that Freires epistemology leads us to the understanding that education, citizenship and childhood
are not only abstract concepts, but dimensions of a critical and creative praxis that enables us to recognize chil-
dren as citizens and build emancipatory pedagogical practices with them.
Keywords: childhood; citizenship; Paulo Freire; participation; early childhood education.
* Doutora em Educação pela Unicamp. Mestre em Educação pela Universidade Metodista de São Paulo (Umesp). Gra-
duada em Pedagogia e Psicologia. Docente-Pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Univer-
sidade Municipal de São Caetano do Sul (PPGE-USCS). Coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisa Infâncias,
Diversidade e Educação - GEPIDE (PPGE-USCS) e do Grupo de Estudos e Pesquisa Paulo Freire - GEPPF (PPGE-USCS).
Orcid: https://orcid.org/0000-0002-8574-760X. E-mail: martarps@uol.com.br
Recebido em: 15/10/2019 – Aprovado em 21/05/2021
http://dx.doi.org/10.5335/rep.v28i1.10088
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Resumen
Este artículo analiza la relación entre niño, infancia y ciudadanía a partir de diálogos inspirados en Paulo Freire.
El objetivo es presentar las contribuciones de la epistemología de este educador para pensar sobre la constitu-
ción de la ciudadanía infantil y la propuesta de una educación ciudadana para los niños. El diálogo parte de los
resultados de una investigación teórica que investiga en los trabajos de Freire su comprensión sobre los niños, la
infancia y la educación de los niños pequeños. En sus escritos, Freire denuncia las formas de opresión a las que
están sujetos los niños y las niñas y cuán autoritario y antidiálogo es el proceso educativo, silenciando así sus
voces. El autor deende a los niños como sujetos de derechos, incluido el derecho a la palabra y a participación,
proponiendo que las instituciones de educación de la primera infancia se conviertan en centros de creatividad
donde enseñamos y aprendemos con alegría. El estudio concluye que la epistemología de Freire nos lleva a
comprender que educación, ciudadanía y infancia no son solo conceptos abstractos, sino dimensiones de una
praxis crítica y creativa que nos permite reconocer a los niños como ciudadanos y construir com ellos prácticas
pedagógicas emancipadoras.
Palabras clave: infancia; ciudadanía; Paulo Freire; participación; educación infantil.
Introdução
Desde o final da década de 1950, Paulo Freire (2001 [1959]1) já denunciava
as relações autoritárias e antidialógicas às quais as crianças estavam submetidas.
Esse educador pernambucano escrevia sobre o quanto tais experiências têm início
nas famílias e se prolongam nas escolas silenciando meninos e meninas em sua
curiosidade, em seu direito de se expressarem. Discutia, também, que a constru-
ção da autonomia exige experiências democráticas que são negadas às crianças,
sendo necessária a revisão de atitudes das famílias e das instituições educacionais
no sentido de ampliar cada vez mais a participação delas nos diferentes espaços
sociais nos quais convivem.
Esse silenciamento das vozes infantis, presente ainda hoje em nossa so-
ciedade, expressa uma das formas de opressão em que o adulto impõe sobre as
crianças a sua leitura de mundo. Essa ação antidialógica, imposta pelo opressor,
tem como uma de suas principais características o que Paulo Freire chamou de
“invasão cultural” (FREIRE, 2003 [1970]). Invasão porque se trata de conquistar e
dominar, não apenas econômica, mas culturalmente, negando àquele que é domi-
nado o direito de dizer a sua palavra ao mesmo tempo em que desqualifica a sua
cultura.
Nessa relação de dominação, o oprimido deve observar a realidade a partir da
ótica do opressor, jamais da sua. Com isso, verificamos uma das ações mais desu-
manizantes, visto que nega a homens e mulheres a sua vocação ontológica de “ser
mais”, subestimando a sua capacidade de criação e recriação, e afogando neles e
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nelas o desejo de, curiosa e coletivamente, aventurarem-se no conhecimento de si,
do outro e do mundo.
Como assevera Freire, a invasão cultural ocorre de diferentes formas e entre
os diferentes atores sociais e dentre eles estão certamente as crianças. Na invasão
cultural da infância intenta-se tornar inautêntico o agir, o pensar e o sentir das
crianças, compreendendo-as tão somente como reprodutoras da cultura, cabendo,
portanto, aos adultos prepará-las para o exercício da cidadania. Não se reconhece a
criança como cidadã, mas como um “projeto”, como um “vir a ser”.
Nessa forma de invasão, busca-se frear a capacidade de criação de meninos
e meninas, desqualificar a leitura que fazem do mundo e silenciar seus corpos.
Como forma de “domesticação” intenta uma atitude de sujeição a uma determinada
ordem social, negando, assim, as subjetividades e, consequentemente, a afirmação
das crianças como agentes de criação e transformação.
No entanto, como discute Freire, a invasão cultural sempre irá se deparar com
resistências. No caso das crianças, estas insistentemente questionam os currículos
escolares, demonstrando, por meio de suas diferentes formas de expressão, que não
“cabem” nas instituições educacionais historicamente construídas para elas, com
práticas autoritárias e antidialógicas. Contra isso, meninos e meninas resistem.
Como afirma o filósofo Ernani Maria Fiori, no prefácio de Pedagogia do Oprimido
(FREIRE, 2003 [1970], p. 21), “[...] os dominados, para dizerem a sua palavra, têm
que lutar para tomá-la. Aprender a tomá-la dos que a detêm e a recusam aos de-
mais é um difícil, mas imprescindível aprendizado – é a ‘pedagogia do oprimido’”.
Segundo Freire (2003 [1970], p. 154, grifos do autor), renunciar à invasão cul-
tural significa “[...] deixar de estar sobre ou ‘dentro’, como ‘estrangeiros’, para estar
com, como companheiros”. Romper com a invasão cultural da infância, significa
compreender o mundo a partir dos olhos das crianças, o que implica na descons-
trução da cultura do silêncio, e, por sua vez, na construção de uma relação dialógi-
ca com elas, reconhecendo-as como cidadãs e, portanto, como participantes ativas
da e na sociedade. Se assim for, como afirma Tonucci (2005, p.18), “[...] a relação
com elas será correta, entre cidadãos adultos e pequenos cidadãos, mas, agora,
cidadãos”. Do contrário, continuaremos a exclui-las e ficaremos excluídos de seus
direitos, porque sempre serão “futuros cidadãos”.
Desse modo, escutar as crianças, é reconhecer que precisamos delas, uma vez
que são capazes de dar ideias, opiniões e fazer propostas; é considerar suas vozes
nas decisões que envolvem suas vidas e também as nossas, seja no âmbito familiar,
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escolar ou na comunidade, visando a construção de uma sociedade mais democrá-
tica, mais justa e mais humana.
Nesse sentido, este artigo apresenta o aporte teórico de Paulo Freire para
pensar esta criança cidadã e o seu direito à participação política na sociedade e,
em especial, no interior das instituições de educação infantil. A reflexão acerca das
contribuições desse autor é resultado da pesquisa intitulada “Crianças e Infân-
cias em Paulo Freire”, desenvolvida no Grupo de Estudos e Pesquisa Paulo Freire
do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Municipal de São
Caetano do Sul. Trata-se de uma pesquisa de natureza teórica, cujo objetivo é o de
investigar nas obras desse educador sua compreensão sobre as crianças e as infân-
cias e, nessa perspectiva, como sua epistemologia pode contribuir para (re)pensar
a educação das crianças. Por obra definimos, para efeitos desta investigação, os
livros desse autor publicados em português, que foram organizados em cinco pe-
ríodos como uma forma de melhor compreender o contexto de sua produção2. Como
procedimento metodológico, temos realizado nas leituras o rastreamento das pala-
vras: criança, infância ou expressões que remetem a estes universos.
O momento atual é propício para nos debruçarmos sobre a epistemologia e
a vida educadora desse educador, visto vivermos um período de recrudescimento
das formas de violência contra mulheres, negros, negras, indígenas, comunidade
LGBTQI+ e, é claro, as crianças, as que mais sofrem com o desmantelamento das
políticas públicas e das conquistas sociais e históricas resultantes das muitas lutas
travadas pelo povo brasileiro. Assim, em um período em que as forças conservado-
ras buscam amordaçar e silenciar estudantes, docentes, pesquisadores e pesqui-
sadoras, a atualidade do pensamento de Paulo Freire nos convoca à necessidade
política de reinventá-lo, de modo a responder aos desafios de nosso tempo histórico.
Posto isso, que o diálogo apresentando neste artigo possa inspirar o (re)pensar a
relação criança, infância e cidadania e, nela, a proposição de uma educação infantil
cidadã.
Criança: cidadã?
O reconhecimento da criança como sujeito de direitos é muito recente na legis-
lação brasileira, tendo sua origem na promulgação da Constituição federal brasilei-
ra (BRASIL, 1988), fruto de intensas lutas dos movimentos sindicais, feministas,
das mulheres, estudantis, populares que ganharam força, sobretudo na década de
1980, e passaram a reivindicar melhores condições de vida, de trabalho, de edu-
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cação. Desse documento, desdobram-se outras leis que reafirmam os direitos das
crianças, dentre elas o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) (BRASIL, 1990),
que trata da participação da criança na vida familiar, comunitária e política, e o seu
direito à opinião e à expressão; a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDBEN) (BRASIL, 1996), que reconhece o direito à Educação Infantil ao inseri-
-la como primeira etapa da Educação Básica; as Diretrizes Curriculares Nacionais
para a Educação Infantil (DCNEI) (BRASIL, 2010), que reafirmam tais direitos e
explicitam os princípios para a educação das crianças pequenas, sendo eles:
Éticos: da autonomia, da responsabilidade, da solidariedade e do respeito
ao bem comum, ao meio ambiente e às diferentes culturas, identidades e
singularidades.
Políticos: dos direitos de cidadania, do exercício da criticidade e do respeito
à ordem democrática.
Estéticos: da sensibilidade, da criatividade, da ludicidade e da liberdade
de expressão nas diferentes manifestações artísticas e culturais (BRASIL,
2010, p. 16).
As conquistas observadas nessa legislação legitimam-se em documentos de
maior abrangência como: a Declaração Universal dos Direitos da Criança (ONU,
1959) e a Convenção Mundial dos Direitos da Criança (ONU, 1989). Segundo Sar-
mento, Fernandes e Tomás (2007, p. 192):
A Convenção sobre os Direitos da Criança assim como toda a legislação e instrumentos
jurídicos que se reporta às crianças, apesar de todas as limitações e críticas, é uma marca
de cidadania, um sinal da capacidade que as crianças têm de serem titulares de direitos e
um indicador do reconhecimento da sua capacidade de participação.
A afirmação de meninos e meninas como sujeitos de direitos resulta de uma
nova compreensão da criança como um ser potente, agente ativo no meio em que
vive, que lê e comunica o mundo de um modo muito singular e que produz cultura.
Resulta ainda da compreensão de sua educação para além dos contextos familia-
res, envolvendo nesse processo as diferentes instituições da sociedade, dentre elas
as educacionais.
Criança e infância são categorias construídas historicamente, o que significa
dizer que, a compreensão sobre elas foi se modificando ao longo da história em
função dos diferentes contextos sociais, político-econômicos e culturais nos quais
estavam inseridas. Desta maneira, capturadas pelos discursos médico, psicológico,
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pedagógico e sociológico tiveram sua imagem aprisionada à compreensão de uma
“[...] infância universal e um padrão de criança definido pelos critérios de idade, de
dependência em relação ao adulto, em função de uma fragilidade física e psicológi-
ca, e o seu desenvolvimento através de etapas sucessivas. Uma criança a-histórica
e reprodutora da cultura do adulto” (FARIA; GOBBI; SILVA, 2017, p. 17).
Desconstruir essa imagem da criança como um ser da “falta” e da infância
como uma etapa passageira do desenvolvimento humano vem sendo um processo
lento e gradativo. Com isso, apesar do reconhecimento da criança como um ser
potente e de direitos, seja na legislação seja nos estudos sobre a infância, a imagem
da criança como um “vir a ser” ainda se faz bastante presente no interior das insti-
tuições educacionais, configurando-se como um dos desafios à prática pedagógica.
Ora, mas se reconhecer a criança como um ser potente, não apenas no discurso,
mas na sua cotidianidade, já tem se desvelado um processo moroso, mais desa-
fiador ainda tem sido o seu reconhecimento como cidadã. Afinal, será a criança
cidadã? Quando nasce um/a cidadão/cidadã?
Qvortrup (2010) chama nossa atenção para as atitudes ambíguas de nossa so-
ciedade para com as crianças e para a relação entre elas e a política, com destaque
para as formas de proteção às quais meninos e meninas estão submetidos e que ter-
minam por afastá-los dos adultos e de assuntos referentes à economia e à política, o
que considera como uma atitude “irrealista”, uma vez que entre “[...] outras razões,
isto é provado pelo fato de que as crianças são parte de um projeto que faz delas a
matéria para a construção do futuro” (2010, p. 790). Para o autor, se, por um lado,
busca-se proteger as crianças do mundo adulto, separando-as desse mesmo mundo,
por outro, há uma indiferença ou desatenção a elas no desenvolvimento político e
econômico da sociedade, o que as coloca como o grupo geracional mais afetado pelas
desigualdades sociais.
Essa exclusão da participação das crianças da vida política também é debatida
por Sarmento, Fernandes e Tomás (2007, p. 184): “O confinamento da infância a
um espaço social condicionado e controlado pelos adultos produziu, como conse-
quência, o entendimento generalizado de que as crianças estão «naturalmente»
privadas do exercício de direitos políticos”, o que as torna “[...] o único grupo social
verdadeiramente excluído de direitos políticos expressos”. Essa exclusão termina
por invisibilizar meninos e meninas enquanto “atores políticos concretos” e, conse-
quentemente, impacta nas decisões políticas das gerações futuras.
A participação política das crianças é um imperativo para a cidadania da in-
fância. Contudo, ela está condicionada, mas não pré-determinada, às estruturas
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sociais, políticas, econômicas e culturais em que se encontram meninos e meninas.
Sabemos que o conceito de cidadania é uma construção social e, como tal, está vin-
culado ao contexto no qual foi engendrado. Desse modo, ao analisarmos a realidade
brasileira marcada por uma história de escravidão, elitismo e exclusão, em que
a “[...] relação de forças que se estabelece entre grupos com interesses distintos e
antagônicos, esse conceito, como tantos outros, acaba se tornando categoria que
expressa a posição do projeto hegemônico” (BARBOSA; ALVES; MARTINS, 2008,
p. 4).
Nesse projeto, cidadania se restringe aos adultos, sendo as crianças excluídas
em função do fator idade, uma vez que permanece ainda fortemente no imaginário
social a compreensão da criança como um ser imaturo, frágil, dependente, que deve
ser preparado para a vida adulta. Para Sarmento, Soares e Tomás (2004, p. 1), é
esse “[...] conjunto de características bio-psicológicas que supostamente não outor-
gam à criança o conjunto de competências que os adultos consideram necessárias
para o exercício da cidadania”.
Outro fator que coaduna com essa exclusão da criança diz respeito a certa
compreensão de cidadania como algo pronto, acabado, cujo status de cidadão/ci-
dadã se adquire quando adulto, quase que como em um passe de mágica. A esse
respeito, Barbosa, Alves e Martins (2008, p. 4, grifos das autoras) asseveram que:
Quando se trata da infância, a cidadania parece ser colocada como projeto futuro: “a criança
de hoje é [será] a cidadã de amanhã”. Ou seja, é como se a cidadania desabrochasse no
adulto (bem) educado e ajustado às normas e padrões sociais. Porém, aqui não deixa de
haver uma abstração do termo “cidadania”: algo pronto a ser dado em algum momento e em
situações nos quais o sujeito recebe um título socialmente concedido.
A cidadania não é algo pronto e não se dá a partir de uma determinada ida-
de. Como seres inacabados, cuja vocação ontológica é a de “ser mais” (FREIRE,
2003 [1970]), lemos e comunicamos o mundo desde que nascemos e, nesse processo,
vamos nos constituindo como cidadãos/cidadãs. Desse modo, embora o reconheci-
mento legal dos direitos das crianças seja uma conquista fundamental, ele não é
suficiente; é preciso também criar condições para o seu exercício por meio da parti-
cipação ativa das crianças nas diferentes esferas da sociedade, a qual é aprendida
nas práticas cotidianas, constituindo-se em uma aprendizagem que nos acompa-
nha ao logo da vida.
Nesse processo, há que se respeitar a razão infantil, ou seja, a visão de mundo
das crianças, compreendendo-a como a faculdade humana que elas possuem de
criar estruturas ideativas a partir de suas impressões, sentimentos e compreen-
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sões do seu entorno. Na razão infantil não há uma hierarquização das linguagens,
uma vez que ela se efetiva por diferentes formas de expressão em que a corporeida-
de não fragmenta as sensações, as emoções e a cognição (SILVA; FASANO, 2020).
Sendo assim, meninos e meninas são capazes de intervir no mundo, expressando
suas ideias, escolhas, opiniões e fazendo propostas a respeito de todos os problemas
que se colocam em seu cotidiano, isso porque “[...] elas também ali vivem, como
cada cidadão, e ali vivem a partir de seu próprio ponto de vista particular que é, ao
mesmo tempo, mais ‘baixo’ e mais ignorado do que o dos outros” (TONUCCI, 2005,
p. 20-21, grifos do autor).
A cidadania da infância, ao defender o direito de participação política das
crianças, não minimiza a importância das medidas de proteção e provisão, que
devem ser garantidas pela família e Estado. De acordo com Soares (2005, p. 35-36,
grifos da autora):
Direitos de provisão – implicam a consideração dos programas que garantam os
direitos sociais da criança, nomeadamente o acesso de todas as crianças a direitos
como a saúde, educação, segurança social, cuidados físicos, vida familiar, recreio
e cultura;
Direitos de protecção – implicam a consideração de uma atenção distinta às crianças, de
um conjunto de direitos acrescidos, que, por motivos diversos, nomeadamente situações de
discriminação, abuso físico e sexual, exploração, injustiça e conflito, se encontrem privadas
ou limitadas no exercício dos seus direitos;
Direitos de participação – implicam a consideração de uma imagem de infância activa,
distinta da imagem de infância objecto das políticas assistencialistas, à qual estão asse-
gurados direitos civis e políticos, ou seja, aqueles que abarcam o direito da criança a ser
consultada e ouvida, o direito ao acesso à informação, à liberdade de expressão e opinião e o
direito a tomar decisões em seu benefício, que deverão traduzir-se em acções públicas para
a infância, que consideram o ponto de vista das crianças.
A compreensão da indissociabilidade destes direitos: provisão, proteção e
participação é fundamental, pois reconhecer a criança como um sujeito capaz de
participar das decisões referentes à sua vida, não significa negar a necessidade de
cuidados e proteção. Sobre essa indissociabilidade, Soares (2005) discute os para-
digmas da criança dependente, emancipada e participativa como formas de com-
preensão do exercício dos direitos de meninos e meninas. Segundo essa pesquisado-
ra, os paradigmas da criança dependente e da criança emancipada se apresentam
com posições quase que incompatíveis, em um movimento que oscila entre “[...] o
proteccionismo exacerbado e a emancipação das crianças” (2005, p. 42), enquanto
que o terceiro, o da criança participativa, “[...] recupera a ideia de interdependência
do exercício dos direitos, considerando que os direitos de protecção e participação
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não são incompatíveis (2005, p. 42). Contudo, como ressaltam Sarmento e Pinto
(1997), desses três direitos, não se observam avanços no que diz respeito ao direito
à participação, seja na construção de políticas seja na organização das instituições
educacionais.
Freire (2001 [1993]), ao defender a participação, também alerta para o caráter
indissociável entre participação e proteção. Ao propor que as cidades estimulem as
suas várias instituições sociais a se empenharem em campanhas que tenham por ob-
jetivo desafiar crianças, jovens e adultos a refletirem sobre o direito de ser diferente,
adverte que essa discussão deva ocorrer “[...] sem que isto signifique correr o risco de
ser discriminado, punido ou, pior ainda, banido da vida” (2001 [1993], p. 26).
O direito de ser diferente afirma nossa vocação para “ser mais”, estando esta
condicionada pelo contexto social, político, econômico e cultural no qual estamos
inseridos. Com isso, no aprendizado da democracia, Freire (2003 [1994], p. 203)
ressalta alguns aspectos que devem ser “política e pedagogicamente tratados”:
A luta, no Brasil, pela democracia, passa por uma série de possíveis ângulos a ser política e
pedagogicamente tratados – o da justiça, sem a qual, não há paz, o direitos humanos, o do
direito à vida, que implica o de nascer, o de comer, o de dormir, o de ter saúde, o de vestir,
o de chorar os mortos, o de estudar, o de trabalhar, o de ser crianças, o de crer ou não, o de
viver cada um e cada uma a sua sexualidade como bem lhe aprouver, o de criticar, o de dis-
cordar do discurso oficial, o de ler a palavra, o de brincar não importa a idade que se tenha,
o de ser eticamente inconformado do que ocorre no nível local, no regional, no nacional e
no mundial.
Ao afirmar o direito de as crianças serem crianças, Freire chama a atenção
para as muitas crianças que têm sido expropriadas destes tantos direitos, em espe-
cial aquelas das classes populares, seja pela condição de pobreza, fruto das grandes
desigualdades sociais, seja pela cor de sua pele, gênero, idade, etnia.
Cabe ressaltar que as enormes desigualdades e a discriminação contra e entre
as crianças assentam-se na estrutura social. Desse modo, não se pode deixar de
considerar a interdependência dos diferentes direitos. Defender o direito à educa-
ção, por exemplo, implica, necessariamente, segundo Arroyo (2015, p. 20), defen-
der o “[...] direito à vida, trabalho, terra, território, teto, identidades, igualdade,
diversidade, justiça... direitos atrelados a outro projeto de sociedade, de campo, de
cidade, de padrão de trabalho e de poder”.
Assegurados na forma de Lei, estão os direitos à vida, à saúde, à liberdade,
ao respeito, à dignidade, à convivência familiar e comunitária, à educação, à cul-
tura, ao esporte e ao lazer, à proteção. Entretanto, nesse mundo ao avesso, como
denuncia Galeano (1999), há mais de vinte anos, é negado às crianças o direito de
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serem crianças, de brincar, não trabalhar, contar suas histórias, criar, imaginar.
Crianças, ricas ou pobres, todas confinadas aos valores do mercado, todas fadadas
à solidão. Solidão, como afirma Tonucci (2008), que se caracteriza como uma doen-
ça social que atinge crianças e adultos. Ambos presos em sua “casa fortaleza”, pois
lá fora, na cidade, há muitos perigos; instaurado o medo, a cidade já não pertence
mais aos sujeitos e, em especial, às crianças. Também não lhes pertence mais o
tempo e espaço só para si, em que possam criar, brincar, sujar-se, divertir-se, não
fazer nada.
Defender, portanto, a participação infantil significa compreender não apenas
a potencialidade das crianças, mas também sua vulnerabilidade, e protegê-las,
sem com isso (ou em nome disso) sufocar seu direito de dizerem sua palavra, de
se expressarem livremente, visto que, esse direito “[...] deve incluir a liberdade de
procurar, receber e divulgar informações e ideias de todo tipo, independentemente
de fronteiras, seja verbalmente, por escrito ou por meio impresso, por meio das ar-
tes ou por qualquer outro meio escolhido pela criança” (ONU, 1989, não paginado).
Como sujeitos de criação e não da pura adaptação, a presença das crianças
nas diferentes instâncias sociais, através de suas resistências, transgressões e
afirmando-se como sujeito de direitos, pressiona a (re)invenção das instituições
educativas e nelas a construção de outras identidades docentes.
Por uma educação infantil cidadã
Um dos ensinamentos de Paulo Freire é o de que a educação deve ser construí-
da com os educandos e as educandas, a partir de uma relação dialógica. No caso da
educação infantil, embora verifiquemos uma concepção mais afirmativa da criança
e da infância nos documentos legais e nas pesquisas da área, observamos ainda,
em muitas instituições, um abismo entre o discurso e as práticas educativas cons-
truídas para as crianças pequenas. Em sua maioria, revelam uma educação bancá-
ria, fundamentalmente narradora, nas quais podemos notar falas sobre conteúdos
“mortos” que não se referem à realidade das crianças, sendo-lhes alheios à sua
experiência existencial, e que, portanto, não se trata de uma educação que objetive
uma ação transformadora, mas apenas a fixação, a memorização e a repetição.
Dentre essas práticas, encontram-se aquelas que priorizam a memorização
do sistema alfabético e numérico, a cópia e repetição de palavras ou até mesmo
sílabas, no intuito de preparar as crianças para o ensino fundamental; ou ainda,
aquelas que didatizam as brincadeiras, reafirmando um modelo escolar hegemô-
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nico que não valoriza a curiosidade, a inventividade, as múltiplas linguagens das
crianças e suas produções culturais. Tais práticas são reveladoras de uma história
em que pouco se olhou para o mundo das crianças a partir dos seus olhos, mas sim
a partir da maneira como o adulto via/vê o mundo das crianças. Desconstruir tais
práticas implica reconhecer a criança em sua alteridade, uma vez que:
[...] a infância nunca é o que sabemos (é o outro dos nossos saberes), mas, por outro lado,
é portadora de uma verdade à qual devemos nos colocar à disposição de escutar; nunca é
aquilo apreendido pelo nosso poder (é o outro que não pode ser submetido), mas ao mesmo
tempo requer nossa iniciativa; nunca está no lugar que a ela reservamos (é o outro que não
pode ser abarcado), mas devemos abrir um lugar para recebê-la. Isso realmente é aceitar a
criança como um outro (LARROSA, 2003, p. 186).
Receber a criança como um outro passa por compreender a infância para além
de uma etapa passageira do desenvolvimento humano, mas como um tempo social
importante em si mesmo e que nos acompanha na vida adulta, o que nos remete
a pensá-la como a própria condição da existência humana. Sendo assim, ela não é
apenas cronologia.
Encontramos essa compreensão da infância em Paulo Freire, esse educador
que se autodenominou como um “menino conectivo”, um homem que não deixou
morrer o menino que foi e que não pôde ser. Em suas palavras: “Eu acho que uma
das coisas melhores que eu tenho feito na minha vida, melhor do que os livros que
eu escrevi, foi não deixar morrer o menino que eu não pude ser e o menino que eu
fui, em mim” (FREIRE, 2001, p. 101).
Essa sua conexão com a infância, sobretudo quando relata suas próprias expe-
riências, denota uma imagem mais afirmativa da infância, “[...] a infância como algo
que o amadurecimento faria bem em preservar, alimentar e cuidar na medida em
que outorga vida à vida e, por isso, nunca deve abandonar-se” (KOHAN, 2018, p. 10).
A infância, desde essa perspectiva, ao desconstruir a ideia de se tratar apenas
de uma etapa passageira do desenvolvimento, desconstrói também a compreensão
da criança como um ser da “falta”, pois, como afirma Agamben (2005), a ausência
de voz (en-fant) não significa uma falta, e sim uma condição, visto ser na infância
que nos constituímos como sujeitos na e pela linguagem. De acordo com esse filó-
sofo:
[...] a infância que aqui está em questão, não pode ser simplesmente algo que precede
cronologicamente a linguagem e que, a uma certa altura, cessa de existir para versar-se na
palavra, não é um paraíso que, em um determinado momento, abandonamos para sempre
a fim de falar, mas coexiste originalmente com a linguagem, constitui-se aliás ela mesma
na expropriação que dela efetua, produzindo a cada vez o homem como sujeito (2005, p. 59).
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Segundo Agamben (2005), a condição de “en fant” é o que nos torna abertos
ao mundo, transformando, no cotidiano, a língua em discurso capaz de nos colocar
na situação de criadores de cultura. Desse modo, porque somos não falantes e nos
construímos como falantes há história. E porque os falantes continuam infantes e
continuam também, permanentemente, aprendendo a falar e a serem falados, a
historicidade do ser humano segue fazendo-se. Assim, se para Agamben há história
porque há infância, para Freire há infância devido à condição de inacabamento do
ser humano. Não é possível falar em infância sem a consciência de nossa condição
de seres inacabados, ao mesmo tempo em que tal condição, para não ser estéril, so-
licita de nós a capacidade de criar nosso agir no mundo molhado da nossa condição
infantil (SANTOS NETO; SILVA, 2006).
Nesse sentido, compreendemos que é preciso olhar e escutar esta infância, ou
seja, mantê-la viva. A infância das crianças e a nossa enquanto educadores e edu-
cadoras, para que possamos em nossa docência construir uma pedagogia curiosa,
que pergunta e se pergunta constantemente, e que reconheça que meninos e meni-
nas são portadores “de uma verdade” que precisa ser escutada. Que nesse processo
possamos viver uma vida educadoramente infantil, aquela que, inquieta, incansá-
vel, esperançosa está disposta a recomeçar, pois, de acordo com Kohan (2020, p. 98)
“[...] a infância que educa não tem idade nem se mede pela passagem das horas, dos
dias, dos anos... a infância educa em outro tempo, um tempo próprio... de presença
e presente. Um tempo infantil. [...]. Um tempo de pura presença”.
E aqui encontramos o tempo da criança, o tempo presente e de presença. Um
tempo presente de um eterno recomeçar. Um tempo de intensidade. Meninos e me-
ninas são seres ativos e na relação com o mundo humanizam-se ao mesmo tempo
em que também humanizam o mundo; portanto, não se entregam passivamente à
lógica adultocêntrica, mas se envolvem nos processos de socialização, lendo o mun-
do a partir de suas experiências existenciais e, no exercício da dialogicidade, produ-
zem as culturas infantis que, se devidamente consideradas, podem levar a cultura
estabelecida historicamente pelos adultos a ser repensada e ser reinventada e, com
isso, construir pedagogias das infâncias com as crianças e não para as crianças.
Nesse contexto, a participação das crianças é imprescindível para cidadania
da infância. Isso porque a cidadania só se concretiza quando os sujeitos participam
ativamente visando à transformação da sociedade. Para Freire, o ser humano é
participante ativo na construção histórica de seus direitos, tendo a educação uma
importante contribuição na formação dos cidadãos e cidadãs. Vale destacar que
esse educador, sem superestimar o papel da educação, defende sua relevância na
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construção de uma cidadania ativa. Segundo ele, sobre a relação dialética entre
educação e cidadania:
Não dá para dizer que a educação crie a cidadania de quem quer que seja. Mas, sem a
educação, é difícil construir a cidadania. A cidadania se cria com uma presença ativa, crí-
tica, decidida, de todos nós com relação à coisa pública. Isso é dificílimo, mas é possível. A
educação não é a chave para a transformação, mas é indispensável. A educação sozinha não
faz, mas sem ela também não é feita a cidadania (1995, p. 74).
Importante pontuar que, para o autor, o papel que a educação possui no pro-
cesso de transformação social não se baseia em um certo idealismo que não leva
em conta os contextos históricos e as condições socioculturais em que estão imersos
homens e mulheres, mas na sua profunda crença na capacidade dos seres huma-
nos, em colaboração, ao desvelar o mundo, transformá-lo. Assim, faz parte des-
se processo o sentido da crítica e dos conflitos, sendo esses inerentes ao espaço
público. A participação, portanto, é fundamental no processo de libertação, visto
que, nas palavras de Freire (2003, [1970], p. 90): “[...] a existência humana não
pode ser muda, silenciosa, nem tampouco pode nutrir-se de falsas palavras, mas
de palavras verdadeiras, com que os homens [e mulheres] transformam o mundo”.
Esse processo se inicia desde a mais tenra idade e tem na escola democrática uma
instância importante para seu exercício (FREIRE, 1993).
A criança compreendida por Freire é potente, curiosa, criativa, perguntadeira,
e precisa ser estimulada pelo educador e pela educadora de modo a ir:
[...] descobrindo a relação dinâmica, forte, viva, entre palavra e ação, entre palavra-ação-
-reflexão. Aproveitando-se, então, exemplos concretos da própria experiência dos alunos
durante uma manhã de trabalho dentro da escola, no caso de uma escola de crianças, es-
timulá-los a fazer perguntas em torno da sua própria prática e as respostas, então, envol-
veriam a ação que provocou a pergunta. Agir, falar, conhecer estariam juntos (FREIRE;
FAUNDEZ, 2017 [1985], p. 72).
Meninos e meninas têm o direito de participar ativamente dos processos edu-
cativos em uma relação horizontal, o que não significa a negação da autoridade
do educador, da educadora e nem a compreensão de que docentes e crianças são
iguais; ao contrário, afirmamos com isso a posição democrática entre eles e elas,
em que cada um conserva e defende sua identidade e em diálogo aprendem em
comunhão. Em Pedagogia do oprimido, Freire (2003 [1970], p. 81) afirma que:
Ao fundar-se no amor, na humildade, na fé nos homens, o diálogo se faz uma relação ho-
rizontal, em que a confiança de um pólo no outro é consequência óbvia. [...]. Se a fé nos
homens é um dado a priori do diálogo, a confiança se instaura nele. A confiança vai fazendo
os sujeitos dialógicos cada vez mais companheiros na pronúncia do mundo.
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Uma relação dialógica com as crianças pressupõe acreditar nelas, confiar em
sua capacidade de ler o mundo e de dizer a sua palavra a partir de suas diversas
formas de expressão. Por essa razão, Freire defende que o educador e a educadora
devem estimular o gosto das crianças pelas artes, pelos meios de comunicação, pela
leitura e escrita. Que respeitem nelas o seu brincar. A expectativa é a de que elas
avancem em seu conhecimento do mundo e que o façam de maneira participativa e
investigativa. E para que isso seja respeitado e considerado na prática educativa,
é preciso que educador e educadora se coloquem também em uma posição apren-
dente, isto é, de modo que possam aprender com o aprendizado da própria criança.
Aprender com a criança e com a infância...esta reflexão nos remete à Pedago-
gia da Autonomia.... Em Pedagogia da Autonomia, um dos saberes necessários à
prática educativa apresentado por Freire (1997 [1996], p. 23) é o de que “não há
docência sem discência”, pois enquanto ensinam, educador e educadora também
aprendem. E aprendem na relação com seus educandos e educandas mediatizados
pelo mundo, visto serem estes e estas sujeitos de sua própria formação e não obje-
tos. Assim, para Freire, o educador e a educadora progressistas não podem exercer
uma pedagogia imobilizante, que se constitua em mera transferidora de conteúdos
curriculares.
A criança, sujeito de sua formação, deve ser respeitada como tal. Escutar suas
vozes constitui-se em um saber essencial à educação como prática da liberdade.
Freire, acerca da ação antidialógica e autoritária da escola, relata a conversa com
um grupo de estudantes de uma escola de primeiro grau (hoje, ensino fundamental)
em que um dos educandos afirmava a necessidade de se escutar sempre as crianças
sobre o que lhes é ensinado. Dizia o estudante: “Nunca nos perguntaram sobre o
que queremos aprender. Pelo contrário, sempre dizem o que a gente deve estudar”
(FREIRE; GUIMARÃES, 1984, p. 77). Freire pontua dessa experiência o fato de
que meninos e meninas quando chegam às escolas têm algo a dizer e não apenas
a escutar, sendo assim, é preciso escutá-los não importando a idade que tenham.
O reconhecimento da importância da escuta das crianças está presente no
discurso de muitos educadores e educadoras, motivado, sobretudo, por estudos e
pesquisas da área da infância. Contudo, quando observamos o cotidiano de creches
e pré-escolas verificamos, em muitas destas instituições, uma prática pedagógica
esvaziada de sentido, pois nelas não há escuta e, consequentemente, não há diálo-
go. O que se nota é um discurso sobre a realidade. Como meio de buscar coerência
entre o discurso e a prática entendemos que retomar a concepção freiriana de diálo-
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go, escuta e amorosidade, pode contribuir no sentido de ressignificar tais conceitos
e com isso (re)pensar sua materialidade no cotidiano da educação infantil.
Como já mencionado neste texto, o diálogo é o encontro entre os seres huma-
nos que, mediatizados pelo mundo, o pronunciam, o que remete a uma profunda
crença neles e em sua capacidade de ler e dizer o mundo. É, portanto, a força
propulsora de um pensar crítico, que ao problematizar a realidade objetiva trans-
formá-la. Nesse sentido, como uma “exigência existencial” não pode ser reduzido
ao depósito de ideias de um sujeito sobre outro, como se verifica em perspectivas
antidialógicas, bancárias, nas quais as crianças são vistas como um futuro adulto,
que precisa se adaptar a uma sociedade pensada e construída pelos adultos para
elas e não com elas.
O diálogo implica necessariamente em humildade e abertura, reconhecendo
que ninguém sabe tudo e que ninguém sabe nada, mas que nesse encontro somos
capazes de saber mais. No caso da educação infantil, isso exige escutar as crianças.
Escuta que solicita silêncio por parte do educador e da educadora, o que não signifi-
ca omissão ou abandono, mas um profundo respeito à capacidade e às formas pelas
quais as crianças pensam e agem no mundo (SILVA, 2017).
O silêncio, enquanto um valor educativo, possibilita que meninos e meninas
possam dizer a sua palavra a partir de suas múltiplas linguagens. Cabe ressaltar
que a palavra em Freire reveste-se do sentido de dizer o mundo e agir sobre ele,
portanto, uma práxis social que nos impele ao compromisso com o processo de hu-
manização de todos e todas. Nesse processo, o aprendizado da escuta se faz essen-
cial, pois é escutando as vozes das crianças que aprendemos a falar com elas, visto
que, “Somente quem escuta paciente e criticamente o outro, fala com ele, mesmo
que, em certas condições, precise falar a ele. O que jamais faz quem aprende a
escutar para poder falar com é falar impositivamente (1997 [1996], p. 127).
A escuta, o diálogo, demandam um querer bem às crianças e ter a coragem
de dizê-lo, de falar de amor por elas enquanto compromisso não apenas técnico,
mas também ético, político e estético (FREIRE, 1993, 1997 [1996]). Nesse sentido,
educar dialogicamente é um ato de amor, é um comprometer-se consigo e com o
outro na luta pela libertação de todos e todas. A amorosidade, portanto, refere-se à
radicalidade de uma exigência ética, visto caracterizar-se como uma intercomuni-
cação entre duas consciências que se respeitam e que têm um profundo compromis-
so uma com a outra. Daí o fato de Freire afirmar que não há diálogo se não houver
um profundo amor ao mundo e aos homens e mulheres. Trata-se, deste modo, de
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um “amor armado”, um “[...] amor brigão de quem se afirma no direito ou no dever
de ter o direito de lutar, de denunciar, de anunciar” (1993, p. 57).
A defesa e a concretude de uma educação emancipadora na educação infantil
implicam em oferecer, desde os berçários, espaços e atividades em que os bebês e as
crianças pequenas possam fazer escolhas, tomar decisões, explorar, descobrir, per-
guntar, perguntar-se, narrar, debater, dizer sua palavra, participar. Nesse sentido,
encontramos em Freire pistas para pensarmos a materialização dessa participa-
ção, que deve partir da cotidianidade das crianças e considerar suas várias formas
de ler e comunicar o mundo.
Em diálogo com o educador Sérgio Guimarães, Freire defende o brincar como
linguagem fundamental da infância, como o modo pelo qual meninos e meninas
vão se desvelando, apropriando-se e confrontando-se com o mundo em que vivem
(FREIRE; GUIMARÃES, 1984). O brincar constitui-se como espaço de ação e de
compreensão da criança sobre a realidade; um espaço de descobertas e de apren-
dizagens. Em outro diálogo, discorrendo sobre os recursos da escola pública, os
autores pontuam:
[...] eu acho que o problema não é tanto porque sejam pedrinhas e tampinhas de garra-
fa. Acho que isso poderia dar uma excelente educação, se a escola realmente fosse capaz,
como política, de aproveitar os recursos naturais, aqueles fragmentos de mundo com que as
crianças brincam, por exemplo. Seria exatamente a partir da brincadeira delas com esses
pedaços de coisas e com essas coisas, que elas poderiam compreender a razão de ser das
próprias coisas (FREIRE; GUIMARÃES, 1982, p. 47).
Neste diálogo, Freire defende que a espontaneidade, a imaginação, a expres-
sividade, a inventividade e a criatividade das crianças não devem ser negadas “[...]
em nome da instalação de uma cega disciplina intelectual” (FREIRE; GUIMA-
RÃES, 1982, p. 53). No entanto, isso não significa a ausência de uma intenciona-
lidade pedagógica que, em Freire, intenta a ampliação da leitura de mundo pela
criança, uma leitura que possa ir se fazendo cada vez mais crítica.
Deste modo, o papel do educador e da educadora não é o de discursar sobre a
realidade mostrando às crianças o que ela é, segundo seu olhar adulto, mas instigar
a curiosidade para que elas possam, de maneira ativa, criativa e coletiva, desvelar
a realidade e transformá-la. Aqui caberia aos(às) docentes respeitar as diferentes
leituras, as diferentes compreensões e opiniões, sem, contudo, deixar de dizer tam-
bém a sua palavra. Freire assevera que o educador “[...] tem que ter a coragem de
dizer aos meninos como é que ele pensa também, desde que respeite a diferença
entre ele e os meninos. O que vale dizer: desde que exercite a tolerância, que é, em
curta análise, o respeito à diferença” (FREIRE; GUIMARÃES, 1984, p. 18).
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Nesse movimento dialético de leitura de mundo, uma outra pista diz respeito
às perguntas, pois para Freire, o ato de conhecer começa com o perguntar; são as
perguntas que instigam a busca pelas respostas. Para esse educador, “[...] é possí-
vel e é preciso fazer com as crianças um tipo de educação criadora, desinibidora,
uma educação que não se limite, nas crianças, o direito de perguntar; uma educa-
ção que, inclusive, sugira na prática, à criança, que ela jamais morra como criança”
(VANNUCCHI; SANTOS; FREIRE, 1983, p. 69).
A educação, de um modo geral, é uma educação das respostas e não das per-
guntas. Ao denunciar a pedagogia das respostas, que ainda marcam muitas de
nossas instituições educacionais, Freire alerta que:
[...] a repressão à pergunta é uma dimensão apenas da repressão maior - a repressão ao ser
inteiro, à sua expressividade em suas relações no mundo e com o mundo. O que se pretende
autoritariamente com o silêncio imposto, em nome da ordem, é exatamente afogar nele a
indagação (FREIRE; FAUNDEZ, 2017 [1985], p. 68).
Construir uma relação dialógica com meninos e meninas, reconhecendo-os
como participantes ativos da e na sociedade implica compreender o mundo a partir
dos seus olhos. Para tanto, é preciso criar com elas o hábito de perguntar, de se
espantar; de viver a pergunta, a indagação; de instigar a curiosidade pelo mundo
físico e social. Concordando com Freire, a pedagogia da resposta é uma “[...] peda-
gogia da adaptação e não da criatividade. Não estimula o risco da invenção e da
reinvenção. [...] negar o risco é a melhor maneira que se tem de negar a própria
existência humana” (FREIRE; FAUNDEZ, 2017 [1985], p. 75).
Como nos constituir cidadãos/cidadãs sem indagarmos e nos indagar? Sem
correr riscos? Sem sonhar a reinvenção de um outro mundo possível? Sem resis-
tir às formas de opressão? Sem lutar? É preciso conhecer a realidade para trans-
formá-la e o ato de conhecer inicia-se pelas perguntas. Assim, temos que romper
com o silêncio imposto e em seu lugar construir um movimento de perguntar e
perguntar-se, em que a dialogicidade, a amorosidade e a ludicidade constituam-se
como dimensões fundamentais à participação das crianças e à construção de uma
educação infantil cidadã.
Cidadã porque reconhece as crianças como cidadãs hoje, com direito à parti-
cipação, provisão e proteção. Cidadã, pois, com clareza de seu compromisso ético e
político na construção de uma educação emancipadora, faz-se e refaz-se no exercí-
cio cotidiano da cidadania, em um espaço coletivo de diálogo e partilha, não sendo
este, portanto, um conceito abstrato e esvaziado de sentido. Cidadã porque ao reco-
nhecer tal compromisso, luta para que todas as crianças e também seus educadores
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e educadoras aprendam e, assim, construam conhecimentos que os possibilitem ter
uma vida digna, o que coloca o desafio de romper com práticas pedagógicas padro-
nizadas e homogêneas. Cidadã, sobretudo, porque em um movimento inquietante
de perguntar e perguntar-se exercita a cidadania no dia a dia, no agora e não como
uma promessa de um tempo que talvez chegará. Crianças e adultos constituem-se
cidadãs/cidadãos na concretude da vida e, sendo assim, é preciso que essa cidada-
nia ativa seja instigada, (re)criada e (re)conquistada todos os dias.
Considerações nais
A epistemologia de Paulo Freire nos remete à compreensão de que educação,
cidadania e infância não são apenas conceitos abstratos, mas dimensões de uma
práxis crítica e criativa, que nos permite reconhecer as crianças como cidadãs e
com elas construir práticas pedagógicas emancipadoras. Práticas estas com aber-
tura suficiente para termos com elas um olhar de respeito a suas singularidades,
suas necessidades e seus direitos, dentre estes, o direito a dizer sua palavra e a
participar das decisões que envolvem suas vidas.
Concordamos, assim, com Freire quando ele afirma que a educação tem papel
fundamental na constituição da cidadania, visto ser esta a expressão dos interes-
ses tanto pessoais quanto coletivos dos diferentes sujeitos que atuam criticamen-
te sobre a realidade. Nesse sentido, a educação infantil, como primeira etapa da
educação básica, precisa criar um ambiente educativo marcado pelo exercício da
cidadania, cuja participação ativa de meninos e meninas, também nos processos de
decisão, seja uma constante no cotidiano das instituições. Com isso, educadores e
educadoras são desafiados a descentrarem-se da hegemonia adultocêntrica, para
que, desde uma perspectiva dialógica, e porque não infantil, possam estimular as
crianças no desvelamento e reinvenção do mundo.
Pensar uma educação infantil cidadã, que seja construída com as crianças
e não para as crianças, exigirá recriar o ambiente educacional, retirando dele as
mordaças e freios que silenciam as vozes das crianças, o seu brincar, suas produ-
ções culturais e tudo de criativo, inovador e transgressor que pode destes advir,
com vistas à construção de uma sociedade com mais boniteza e justiça social.
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Notas
1 Nas citações das obras de Paulo Freire, após a data da edição utilizada neste trabalho, a opção foi por
colocar entre colchetes [ ] a data da 1ª edição, a fim de considerar o período em que suas ideias foram de-
senvolvidas. Quando estas coincidiram, esse recurso não foi utilizado.
2 Os períodos são: 1) Antes do exílio, em outubro de 1964; 2) O Exílio, de outubro de 1964 a 16 de junho de
1980; 3) Depois do Exílio, de junho de 1980 até a sua saída da Secretaria de Educação do Município de São
Paulo, em maio de 1991; 4) Depois da Prefeitura de São Paulo, em maio de 1991, até sua morte em 02 de
maio de 1997 e 5) Obras publicadas, postumamente, por Ana Maria Araújo Freire. Para o levantamento
bibliográfico da obra de Paulo Freire, os seguintes trabalhos foram utilizados como referências: Paulo
Freire: uma biobibliografia (GADOTTI, 1996), A pedagogia da libertação em Paulo Freire (FREIRE, 2001)
e Paulo Freire: uma história de vida (FREIRE, 2006).
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Marta Regina Paulo da Silva
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ESPAÇO PEDAGÓGICO
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Criança, infância e cidadania: diálogos de inspiração em Paulo Freire
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