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Participação infantil na escola do campo: narrativas produzidas em contexto de pesquisa com crianças
Participação infantil na escola do campo: narrativas produzidas em contexto
de pesquisa com crianças
Child participation at rural school: narratives produced in the context of research with children
Participación infantil en la escuela rural: narraciones producidas en contexto
de investigación con niños
Keylla Rejane Almeida Melo
*
Iara Vieira Guimarães
**
Resumo
Este trabalho discute resultados de pesquisa sobre a infância camponesa, realizada com crianças, na perspectiva
do protagonismo infantil. Tendo a Sociologia da Infância como arcabouço teórico-metodológico, empreendeu-
-se uma investigação com narrativas, tecidas em grupos focais com 20 crianças de 8 a 10 anos de idade, em
escolas do campo localizadas em duas comunidades rurais do Estado do Piauí. As interações, nos grupos focais,
foram desencadeadas a partir de fotograas e desenhos produzidos pelas crianças. Os resultados do estudo
revelaram o potencial que as crianças têm para participarem ativamente de instâncias decisórias na escola, pois
tecem críticas contundentes à forma como esta instituição está organizada, além de apresentarem sugestões
viáveis ao aprimoramento das práticas pedagógicas que se realizam em seu interior. Conclui-se que é urgente
o reposicionamento das crianças no âmbito escolar, como sujeitos que possuem experiências, pensam e contri-
buem para a (re)construção do ambiente educativo, como sujeitos de direitos, aptos à participação social.
Palavras-chave: Educação do Campo. Sociologia da Infância. Práticas Pedagógicas. Direito à Educação. Protago-
nismo Infantil.
*
Doutora em Educação (2019) pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Professora da Universidade Federal do
Piauí. Membro do Núcleo de Estudos, Pesquisa e Extensão em Educação do Campo - Nupecampo (UFPI) e do Grupo
de Estudos e Pesquisas em História e Geograa - GEPEGH (UFU), Brasil. Orcid: https://orcid.org/0000-0003-3818-5955.
E-mail: keyllamelo@ufpi.edu.br
**
Doutora em Educação pela Universidade de São Paulo. Pós doutorado na Universidade Federal Fluminense. Professo-
ra Associada da Faculdade de Educação e do PPGEDU da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Integra a coor-
denação do Grupo de Pesquisa Formação Docente, Saberes e Práticas de Ensino de História e Geograa - GEPEGH, da
UFU, Brasil. Orcid: https://orcid.org/0000-0002-5509-8805. E-mail: iaravgm@gmail.com
Recebido em 09/10/2019 – Aprovado em 04/02/2020
http://dx.doi.org/10.5335/rep.v27i2.11441
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Abstract
This paper discusses results of research on peasant childhood, conducted with children, from the perspective
of child protagonism. Having the Childhood Sociology as a theoretical-methodological framework, an investi-
gation was conducted with narratives, woven in focus groups with 20 children from 8 to 10 years old, in rural
schools located in two rural communities of the State of Piauí. The interactions in the focus groups were trigge-
red from photographs and drawings produced by the children. The results of the study revealed the potential
that children have to actively participate in decision-making bodies at school, as they give scathing criticism to
the way this institution is organized, besides oering viable suggestions for improving the pedagogical practi-
ces that take place within them. It is concluded that the repositioning of children in the school environment is
urgent as subjects who have experiences, think and contribute to the (re) construction of the educational envi-
ronment, as subjects of rights, able to social participation.
Keywords: Rural Education. Childhood Sociology. Pedagogical Practices. Right to Education. Child Protagonism.
Resumen
Este artículo discute los resultados de la investigación sobre la infancia campesina, realizada con niños, desde la
perspectiva del protagonismo infantil. Teniendo la Sociología de la Infancia como marco teórico-metodológico,
se realizó una investigación con narraciones, tejidas en grupos focales con 20 niños de 8 a 10 años de edad, en
escuelas rurales ubicadas en dos comunidades rurales en el estado de Piauí. Las interacciones en los grupos
focales se desencadenaron a partir de fotografías y dibujos producidos por los niños. Los resultados del estudio
revelaron el potencial que los niños tienen para participar activamente en los órganos de toma de decisiones en
la escuela, ya que hacen críticas convincentes sobre la forma en que esta institución está organizada y presentan
sugerencias viables para mejorar las prácticas pedagógicas que se realizan em su interior. Se concluye que es
urgente el reposicionamiento de los niños en el entorno escolar, como sujetos que tienen experiencias, piensan
y contribuyen en la (re)construcción del entorno educativo, como sujetos de derechos, capaces de participación
social.
Palabras clave: Educación rural. Sociología de la infancia. Prácticas pedagógicas. Derecho a la Educación. Prota-
gonismo infantil.
Introdução
A escola é um tempo/espaço que abarca uma boa parte do cotidiano das crian-
ças, definindo muitas vezes sua vida, em função de suas formas de organização. É
como se a escola fosse a atividade central a partir da qual se organizam as outras
atividades infantis. Assim, é importante que a forma de organização desse tempo/
espaço seja, cuidadosamente, pensada de modo a contribuir, efetivamente, no pro-
cesso de aprendizagem e desenvolvimento das crianças.
Acreditamos que essa organização não é tarefa apenas de adultos que se dedi-
cam a concebê-lo para as crianças sem, no entanto, reconhecer que essas apresen-
tam plena capacidade para pensar e elaborar projetos. Trazer à tona as singulari-
dades infantis, considerando as potencialidades e limitações próprias da categoria
geracional a que pertencem, se mostra fundamental, pois a vida das crianças deve
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Participação infantil na escola do campo: narrativas produzidas em contexto de pesquisa com crianças
se desenvolver num contexto de participação ativa, visto que diversos estudos e
pesquisas já comprovaram a afeição da criança à participação social, e a legislação
reconhece o seu caráter político, ao defini-la como sujeito de direitos.
Este trabalho tem como objetivo discutir os sentidos produzidos por crianças
camponesas sobre a escola do campo, demonstrando o potencial que possuem para
analisar o contexto institucional, apontar contradições e propor estratégias de me-
lhoria das práticas que nele se desenvolvem. Sentidos produzidos em pesquisa com
20 crianças, na faixa etária de 8 a 10 anos de idade, à luz dos referenciais teórico-
-metodológicos da Sociologia da Infância. Optamos pelas narrativas como método
de investigação, que foram tecidas em grupos focais, realizados em duas escolas
localizadas em comunidades rurais do centro-norte piauiense.
Para a feitura deste trabalho, dialogamos com estudiosos que se inserem na
vertente da Sociologia da Infância (GOUVÊA, 2011; HENDRICK, 2005; QVOR-
TRUP, 2010; SARMENTO, 2011a, 2011b, 2005, 2003) e da Educação do Campo
(CALDART, 2015), com o intuito de olhar a escola como instituição de educação
formal das crianças, sobretudo das classes populares, que foram mais tardiamen-
te atendidas, como as crianças do campo. Tal entendimento nos remete à ideia
de que é necessária e possível uma organização dessa instituição para atender
às singularidades do contexto campesino, de modo a oferecer às crianças efetiva
aprendizagem para uma formação humana, levando-se em conta a potência que
têm esses sujeitos para participarem de decisões relacionadas a questões que lhes
digam respeito, pois são sujeitos de experiências, mesmo antes de seu ingresso na
escola. Por isso, precisam ser melhor compreendidas e aceitas no cotidiano escolar.
A escola como espaço/tempo de institucionalização da infância
Como processo dialético de formação humana, a Educação do Campo conduz
ao desvelamento da realidade, fazendo emergir as contradições existentes de modo
que possamos compreender a trajetória histórica de constituição do que se coloca
como real. Olhar a escola numa perspectiva de construção histórico-social ajuda-
-nos a compreender que outras formas de organização desse espaço/tempo são pos-
síveis e viáveis. Por isso, é controversa a lógica de naturalização da escola e de suas
práticas, pois subtrai aos sujeitos da educação (alunos, docentes, famílias) o poder
de escolha, de criação, de transformação, o que cristaliza práticas, posturas e ações.
A Sociologia da Infância também lança um olhar crítico sobre a escola, so-
bretudo a escola pública, como espaço institucional, por excelência, de pertença
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das crianças, “criada no final do século XVIII e cuja frequência obrigatória se
institucionalizou a partir da 1ª metade do século XIX, tendo a escolaridade gene
-
ralizada, alargada e estendida desde então, ininterruptamente” (SARMENTO,
2011a, p. 586). É importante que compreendamos a invenção da escola, nos mol
-
des como ela se apresenta hoje, como lugar e tempo privilegiado de socialização
e formação das gerações mais novas. Essa compreensão leva-nos a romper com
uma visão da escola como instituição universal e neutra, de existência necessária
e independente da vontade humana, tão naturalizada a ponto de ser impensável
a sua não existência.
As condições históricas que determinaram a necessidade de existência da es-
cola que, nos seus primórdios, na Grécia, é direcionada a atender a uma parce-
la muito reduzida e privilegiada da população, expandiram-se na modernidade,
tornando-a instituição de passagem obrigatória também das classes populares, a
partir da reivindicação da escola como direito público, gratuito e laico.
Varela e Alvarez-Uria (1992), no texto A maquinaria escolar, ao analisarem as
determinações das condições históricas de existência da escola no interior de nossa
formação social, mostram que desde o século XVI tais condições vinham emergindo,
com destaque para a Igreja Católica como a precursora na instalação do sentimen-
to de infância inocente. Os autores destacam a instituição de diferentes infâncias
no bojo da sociedade de classes: a infância angélica e nobilíssima do Príncipe, a in-
fância de qualidade dos filhos das classes distinguidas e a infância rude das classes
populares. A cada uma delas, uma atenção educacional diferenciada por parte dos
educadores católicos.
A função que a escola ocupa socialmente está diretamente relacionada ao tipo
de sociedade que se pretende construir ou manter. São, portanto, as crises que se
instalam dentro de uma sociedade, a partir das lutas de classes e pelo poder, que
levam ao repensar e à, consequente, reestruturação das instituições sociais, como a
escola. “Na Época Moderna, com a crescente utilização dos códigos formais, houve
a exigência de que a população tivesse domínio de cultura intelectual, cujo com-
ponente elementar era a leitura e a escrita, o que provocou a pressão social pela
escola e a necessidade de sua expansão” (RAMOS; LEITE; FILGUEIRAS FILHO,
2012, s/p). Assim, instituiu-se o privilégio do Estado no campo da educação escolar.
Os estudos de Gondra (2018, p. 21) esclarecem que a emergência de consoli-
dação do Estado Nacional brasileiro no século XIX trouxe consigo a necessidade
de construção do sistema educacional, sendo instaurados muitos dispositivos de
controle, de modo a alcançar um modelo de escola menos arcaico e mais profis-
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Participação infantil na escola do campo: narrativas produzidas em contexto de pesquisa com crianças
sionalizado, buscando produzir “uma estrutura cada vez mais hierarquizada, por
meio de uma forte ramificação do poder”, levando os administradores do Estado
a culparem os professores pelo fracasso da educação. Em relação aos saberes e
modos de transmissão às crianças, o que vigorou, nesta época, foi uma perspectiva
cientificista, que, como afirma Gouvêa (2011, p. 557, grifo da autora), “uma meno-
rização da imaginação e mesmo a negação de sua importância na construção do
conhecimento. Toda uma pedagogia foi edificada na crítica ao uso da imaginação no
trabalho pedagógico com a criança”. Portanto, um aspecto universal do ser criança
foi negligenciado na sua formação.
Sarmento (2011a, p. 588) ressalta que a escola, historicamente, tem se ocu-
pado mais do aluno do que da criança, pois desconsidera seus “saberes e emoções,
aspirações, sentimentos e vontades próprias, para dar lugar ao aprendiz, destina-
tário da acção adulta, agente de comportamentos prescritos, pelo qual é avaliado,
premiado ou sancionado”. Desde a primazia da pedagogia católica, sistematizada
pelo Ratio Studiorum, que se busca a fabricação de um modelo de comportamento
infantil aceitável socialmente, isto é, educado para se tornar um sujeito governado
pelo sistema, pelas regras e pelos docentes.
Desse modo, a ação do Estado vai se ampliando sobre o governo de uma parce-
la da população, por meio da escola, definindo quem são os sujeitos dessa institui-
ção, o que devem aprender, como devem agir, os modos de ensinar, a qualificação
dos quadros do magistério, além de “regulamentar o raio de atuação da própria
escola, adotando um critério baseado na demanda, com base no estatuto de fregue-
sia, paróquia ou curato, delineando, assim, uma geografia desigual da instrução”
(GONDRA, 2018, p. 16).
É nítida, portanto, a histórica exclusão dos povos do campo do processo de
escolarização na sociedade brasileira, pois às populações dispersas ou era negado
o acesso à escola ou era oferecida uma escola de qualidade inferior às das vilas. Se
pensarmos na situação da menina pobre, residente no campo, as oportunidades de
escolarização eram ainda mais raras no Brasil colônia. No capitalismo, a condição
de exclusão desses povos é reforçada, já que o parâmetro hegemônico é dado pelo
urbano, que é a marca da modernidade. Nesse ínterim, o campo, concebido como
espaço de produção, e não de vida humana, ou de vidas que pouco interessam, não
se constitui como prioridade em termos de escolarização, num projeto de sociedade
“civilizada”, como o que se propunha no período imperial.
Nesse sentido, a Educação do Campo (EdoC), constituída no final da déca-
da de 1990, vem se consolidando “como uma articulação nacional das lutas dos
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trabalhadores do campo pelo direito à educação, materializando ações de disputa
pela formulação de políticas públicas no interior da política educacional brasileira”
(CALDART, 2015, p. 1-2).
O processo de redemocratização do Brasil, na década de 1980, resultou na
aprovação da Constituição de 1988, que determinou que o acesso ao ensino obriga-
tório e gratuito é direito público subjetivo. Esse processo foi decisivo para o forta-
lecimento das lutas dos movimentos sociais, inclusive para a garantia de reivindi-
cações atendidas pela nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB),
instituída em 1996, que dentre as conquistas, destacamos o que define o Art. 28 no
que tange à oferta de educação básica para a população do campo, determinando
que sejam promovidas as adaptações necessárias, considerando-se as peculiarida-
des da vida rural, especialmente em relação aos conteúdos curriculares e metodo-
logias; à organização escolar, com calendário escolar que considere as fases do ciclo
agrícola e as condições climáticas; “à adequação à natureza do trabalho na zona
rural” (BRASIL, 1996).
“A escola, enquanto instituição construída socialmente para realizar a for-
mação humana nas diferentes temporalidades de vida, se tornou, no movimento
histórico, dever do Estado e direito do cidadão” (RAMOS; LEITE; FILGUEIRAS
FILHO, 2012, s/p). Contudo, as dificuldades têm se dado na materialização da le-
gislação que assegura esse dispositivo constitucional. Em relação ao Art. 28 da
LDB, por exemplo, supracitado, a realidade tem mostrado que, mesmo localizadas
em contexto rural, as escolas do campo não têm promovido práticas educativas e
pedagógicas centradas nas peculiaridades da vida no campo, apesar das determi-
nações legais, pois ainda são escassas as políticas públicas que permitam trans-
por as conquistas do plano jurídico para o real. Assim, pressões dos Movimentos
Sociais do Campo são traduzidas em textos legais, mas pouco materializadas no
dia-a-dia da escola, a começar pela padronização do tempo escolar, com calendário
letivo igual ao da zona urbana, mesmo a legislação determinando a consideração
dos ciclos agrícolas.
Pelo exposto, é possível afirmar que, historicamente, não há neutralidade nem
universalidade na educação institucionalizada. No caso brasileiro, a escola sempre
foi calcada na separação entre trabalho intelectual e trabalho manual, apesar da
expansão do acesso à escola às camadas populares, preparando-as para as ativida-
des pouco valorizadas socialmente. Uma escola que inclui a garantia da presença
da criança no espaço escolar, mas que continua excluindo os mais pobres por não
oferecer uma escola de qualidade para todos.
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Participação infantil na escola do campo: narrativas produzidas em contexto de pesquisa com crianças
Temos a configuração de um modelo dual de escola: uma destinada aos filhos
da classe burguesa e outra aos filhos dos trabalhadores, com objetivos diferentes,
mas com a disseminação de conhecimentos legitimados por essa classe. Sarmento,
em entrevista a Delgado e Muller (2006, p. 21), destaca os efeitos geracionais ne-
fastos “do sistema dual educativo brasileiro (público para os pobres, privado para
as classes médias e altas)”.
A transformação histórica da escola nos leva a perceber que essa instituição
serve para legitimar um tipo de sociedade que é sustentada a partir da formação
de um modelo de ser humano para nela atuar. No contexto da modernidade, foi
concebida com o objetivo de atender a um conjunto de demandas específicas do pro-
jeto histórico que a planejou e procurou pô-la em prática: educar todos os cidadãos,
alfabetizar cada habitante no uso correto do seu idioma pátrio, ensinar a fazer
cálculos e incutir certos valores e normas, isto é, disciplina como humanização
(SIBILIA, 2012). Contudo, no caso brasileiro, isso não se efetivou e os mais pobres
continuam expropriados de saberes básicos por conta dos problemas enfrentados
pelas escolas.
A escola escolhe o que, como e quando ensinar, com base em intenções que nem
sempre são conscientes para todos os atores que nela atuam. Sarmento (2011a, p.
588) afirma: “Com a escola, a criança assume o estatuto de ser social, objecto de um
processo intencional de transmissão de valores e saberes comuns, politicamente
definidos, e destinatário objectivo de políticas públicas”. Contudo, nada garante
que a presença da criança na escola seja consubstanciada por uma formação de
qualidade, fruto de políticas públicas consequentes e tampouco executadas de for-
ma a garantir os direitos anunciados na legislação.
Assim, a escola acaba por não ajudar a transpor a segregação social que marca
historicamente a sociedade brasileira. Apesar de estar alicerçada em discurso jurí
-
dico de igualdade e equidade, não consegue afetar as enormes barreiras que os mais
pobres enfrentam no processo de mobilidade social, nem consegue atuar de forma
incisiva na indigna concentração de renda e nas desigualdades sociais do país.
O processo de institucionalização da infância é crescente no Brasil, com a pre-
sença das crianças nas instituições escolares sendo concretizada em termos numé-
ricos, mas em relação à qualidade, é preciso questionar. Há dados positivos dessa
institucionalização, assim como há contradições. A Sociologia da Infância ajuda-nos
a compreender esse processo, “que promoveu, progressivamente, um conjunto de
exclusões das crianças do espaço-tempo da vida em sociedade” (SARMENTO, 2005,
p. 368). O autor destaca uma negatividade constituinte na institucionalização da
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infância, que prevalece no disciplinamento das crianças no contexto das escolas,
isto é, há uma “interdição simbólica de pensar as crianças a partir da positivida-
de das suas ideias, representações, práticas e acções sociais” (SARMENTO, 2005,
p. 368). O pensamento infantil não é visto pelos adultos como pensamento distinto,
mas como ilegítimo, incompetente, impróprio e inadequado e isso acabou sendo
reproduzido na escola.
Cumpre-nos destacar a importância inegável de visibilização social das crian-
ças na modernidade, destinando-lhes um lugar social próprio, sendo decisiva a
criação da escola para a construção social do estatuto da infância. No entanto, o
que questionamos são as formas de controle e dominação que assujeitam as crian-
ças e lhes tiram a possibilidade de se constituírem como sujeitos sociais. Hendrick
(2005, p. 38) destaca ser importante a consciência que temos hoje das crianças
como atores sociais, mas ainda prevalece, entre adultos, inclusive professores, a
concepção modernista de criança como ser frágil, carente, sem desejo, sem expe-
riência. “Sempre se faz para as crianças e não com elas”.
Esta não é a perspectiva que deveria estar em voga a partir da legislação que
instituiu como direito da criança, o direito à participação. Nesse sentido, Sarmento,
em entrevista a Delgado e Muller (2006), leva-nos a refletir, a partir de pressupos-
tos da Sociologia da Infância, a possibilidade de construção de uma escola emba-
sada em uma proposta crítica de promoção e estímulo aos direitos das crianças. O
autor propõe estudar “a criança antes do aluno e a interação social inter e intra-
geracional antes da instituição”, considerando que “o aluno é institucionalmente
investido sobre um ser social concreto, a criança, cuja natureza biopsicossocial é
incomensuravelmente mais complexa do que o estatuto que adquire quando entra
na escola” (DELGADO; MULLER, 2006, p. 17).
É fundamental que a escola se ocupe da criança e não apenas do aluno; que
assista a ela com base nas suas necessidades e potencialidades do presente e não
como cidadão do futuro. Com base nessa concepção de criança como um vir a ser,
como alguém que ainda não se configura como cidadão pleno, a natureza lúdica,
imaginativa, interativa, coletiva, das crianças tem sido um aspecto negligenciado
pela escola, pelo próprio modelo organizacional adotado, inspirado em certos aspec-
tos nas fábricas (SARMENTO, 2011a).
É possível compreender o percurso histórico-social, não livre de conflitos e rup-
turas, que permitiu a instalação da escola como instituição que foi se estruturando
para contribuir na conformação de modelos sociais. No entanto, Lefebvre (apud
TELLEZ, 2017) assevera que, apesar de o espaço ser socialmente produzido e his-
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Participação infantil na escola do campo: narrativas produzidas em contexto de pesquisa com crianças
toricamente determinado pelo capital, o espaço escolar é uma espécie de potência
criadora e subversiva na produção do espaço cotidiano, por seu dinamismo social.
No espaço, os grupos sociais se reinventam e produzem outras configurações, nem
sempre confluentes com os interesses dos atores hegemônicos. Isso nos anima para
a resistência e para a luta pela transformação da escola, acreditando que esse
espaço se transforma constantemente.
Reconhecer a criança como ator social significa estabelecer outras pretensões,
exigências e desejos para a escola, de modo geral, e para as práticas docentes, de
modo particular. O modelo pedagógico fundamentado nos preceitos da pedagogia
da transmissão já não dá conta da infância contemporânea. Oliveira-Formosinho
(2007, p. 13) lembra-nos que temos “uma herança rica e diversificada de pensar a
criança como ser participante, e não como um ser em espera de participação”. No en
-
tanto, a pedagogia transmissiva persiste, ignorando um fazer pedagógico que leve
em conta a criança como sujeito de direitos, competente e apta a ter espaço de parti
-
cipação. Retomar essa herança pedagógica pode ser um caminho para a construção
de experiências mais mobilizadoras para as crianças e também para os docentes.
Metodologia
Fundamentada em pressupostos teórico-metodológicos da Sociologia da In-
fância, a pesquisa foi orientada por uma concepção de criança como ator social,
possuidora de experiências, desejos, pontos de vista, que as torna com capacidade
de participação social. Dessa forma, foi imperativo optarmos por um processo in-
vestigativo tendo as crianças como coparticipantes, coprodutoras de dados para a
consecução do objetivo de pesquisa.
Assim, optamos por utilizar a pesquisa com narrativas, entendendo-a como
uma forma de compreensão da experiência vivida que, ao ser narrada, permite
uma rede de interações entre pesquisadora e participantes, produzindo sentidos
sobre o mundo, as pessoas, os lugares. Como afirmam Clandinin e Connelly (2015,
p. 51): “É um tipo de colaboração entre pesquisador e participantes, ao longo de um
tempo, em um lugar ou série de lugares, e em interação”.
Essa interação se deu por meio de grupos focais, num contexto muito especí-
fico de vivência das crianças: a escola, por um período de tempo que possibilitou
o estabelecimento de vínculos de confiança, necessários ao desencadeamento das
narrativas. Grupo focal é entendido aqui como “um conjunto de pessoas seleciona-
das e reunidas por pesquisadores para discutir e comentar um tema, que é objeto
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de pesquisa, a partir de sua experiência pessoal” (POWEL E SINGLE, 1994 apud
GATTI, 2005, p. 7). Considerando o caráter lúdico, imaginativo, criativo das crian-
ças, utilizamos, como dispositivos desencadeadores das interlocuções, fotografias e
desenhos, produzidos por elas, de espaços institucionais que lhes despertavam afe-
tos. Esses dispositivos, apesar de importantes no processo de produção dos dados,
não foram considerados nas análises, sendo o foco apenas as falas das crianças.
Como contextos empíricos foram selecionadas duas escolas localizadas na
zona rural de municípios piauienses, denominadas, neste trabalho, de Escola A e
Escola B. Em cada uma, foi formado um grupo focal com 10 crianças, de 8 a 10 anos
de idade, selecionadas a partir da adesão voluntária destas. Essa faixa etária foi
escolhida pelo fato de considerarmos que, nesta etapa do seu desenvolvimento, as
crianças já conseguem expressar melhor suas experiências.
Em pesquisa com crianças, o cuidado ético tem uma dimensão especial, por
isso, as crianças e suas famílias foram informadas sobre detalhes da pesquisa,
inclusive sobre a condição de anonimato dos participantes na divulgação dos resul-
tados. No texto, foram utilizados nomes fictícios para as crianças e para os sujeitos
por elas citados em seus relatos. Para tanto, cada pai ou responsável assinou um
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, e cada criança interlocutora assinou
um Termo de Assentimento para participar da pesquisa.
Os dados foram organizados em eixos temáticos, definidos com base nas inte-
rações, destacando-se não somente as opiniões majoritárias, mas também as que
ficaram em minoria. Todo o material coletado (transcrições, registros em diários
de pesquisa) foi compatibilizado de modo que o conjunto dos relatos fosse o mais
completo possível. Ancorados em Gatti (2005), construímos planos descritivos das
falas, dividindo-os por contexto empírico, destacando as semelhanças e diferenças
entre os relatos, e agrupando-os em função dos sentidos percebidos.
Os sentidos produzidos pelas crianças camponesas sobre a escola
A partir da discussão da escola como espaço privilegiado de institucionalização
da infância, passamos a discutir a instituição escolar situada no campo, tendo como
mote as perspectivas das crianças interlocutoras sobre este espaço/tempo de ensino
e aprendizagem, depreendidas por meio de suas narrativas nos grupos focais. Como
seres de experiência, ao refletirem sobre a escola, as crianças narraram histórias,
teceram pontos de vista e construíram novos entendimentos de si e do mundo.
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Participação infantil na escola do campo: narrativas produzidas em contexto de pesquisa com crianças
Muitos afetos, risos, brincadeiras foram compartilhados nas seções de grupos
focais sobre a escola, quando narravam acontecimentos marcantes das trajetórias
escolares. Porém, também fizeram denúncias, demonstraram indignação e repul-
sa diante de algumas situações que relataram. Além disso, teceram sugestões de
mudanças que poderiam aprimorar a organização da escola. A seguir, analisamos
cada um dos eixos temáticos.
Infraestrutura física de escolas do campo
As duas escolas possuem prédio escolar próprio, que possibilitam condições
aceitáveis de funcionamento. Os únicos espaços existentes para recreação e lazer
são o pátio e o campo de futebol. O primeiro não foi escolhido por nenhuma criança
para ser fotografado, talvez porque sua função como local de socialização, encontro,
diversão não esteja sendo desempenhada. Durante o tempo em que permanecemos
nas duas escolas, esse espaço funcionou apenas como uma espécie de refeitório.
Já o campo de futebol foi um espaço em que todas as crianças das duas escolas
dirigiram afeto positivo, mesmo reconhecendo a necessidade de melhorias nas es-
truturas existentes.
O campo de futebol da Escola A foi escolhido por três duplas de crianças, mas,
quando perguntamos quem gosta do local, todas as crianças levantaram a mão e
gritaram: “-Eu!”. Na verdade, o campo de futebol dessa escola, é um espaço impro-
visado, organizado durante a execução de um projeto de Educação Ambiental que
reciclou pneus, transformando-os em item de decoração, de delimitação de espaços.
Mesmo assim, as crianças atribuem a esse local improvisado uma grande impor-
tância no contexto escolar, pois representa o lúdico, a liberdade, a brincadeira,
a possibilidade de socialização com os outros. É o espaço onde podem vivenciar
situações típicas da infância (correr, brincar, jogar bola, movimentar o corpo livre-
mente). Porém, elas fazem uma análise muito crítica do lugar, apontando diversas
problemáticas, bem como destacam possibilidades de melhoria. Uma criança cita,
por exemplo, a necessidade de construir uma quadra.
O mesmo pode ser dito em relação ao campinho da Escola B, que se assemelha
mais a um campo de futebol, mas também apresenta diversos problemas aponta-
dos pelas crianças, mesmo sendo um lugar de afeto positivo para todas elas. Em
seus posicionamentos, as crianças consideram diversos aspectos para aprimorar
o espaço que já existe, embora uma criança fale da possibilidade de construção de
uma quadra em outro terreno. Há concordâncias, discordâncias, complementações
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a ideias dos outros, mas, em síntese, desejam um espaço melhor estruturado, mais
amplo, com telas que impeçam a bola de sair, com cobertura que as abrigue do sol,
possibilitando sua utilização em qualquer momento do dia.
O campo de futebol representa, para as crianças, a materialização da pecu-
liaridade do ser criança. Apesar dos problemas apontados, é um espaço pelo qual
nutrem grande afeto, o que pode ser visivelmente constatado pelo trecho de anota-
ção escrito e lido pela Flávia (10) no momento em que analisávamos as fotografias
do campo de futebol: “- O campo é legal porque a gente pratica coisas novas e faz
a gente se sentir bem. Quando eu entro nesse campo eu sinto uma coisa tão legal
dentro de mim, eu não sei nem explicar”.
Passeggi, Nascimento e Oliveira (2016), em pesquisa narrativa realizada com
crianças da zona rural, explicitam que a educação no meio rural reflete o que há de
mais rudimentar no que se refere ao tratamento dado à educação no Brasil. Sem
deixarem de reconhecer que essa é uma situação que aflige a educação brasileira
de forma geral, as autoras reconhecem que a precariedade é preponderante nas
áreas rurais. Vemos, pelos diálogos com as crianças, a importância atribuída por
elas a uma quadra de futebol na escola. E, mesmo sendo uma construção cujos
custos não são altos, não se configura como um investimento prioritário do poder
público, o que faz com que a própria escola, com parceria de voluntários, alunos,
famílias, improvisem espaços para a prática de esportes.
As crianças, em suas narrativas, trouxeram evidências dessa precariedade
histórica a qual estão submetidas as escolas do campo brasileiro. A infraestru-
tura física insuficiente para dar conta de todas as atividades que precisam ser
desenvolvidas na/pela escola agrava-se com a falta de manutenção adequada dos
espaços. Em suas análises pormenorizadas sobre mais um espaço improvisado na
Escola A: local onde armazenam o lixo, as crianças denunciaram a precariedade
das instalações, a ausência de um espaço específico com tal finalidade, as questões
de higiene, promoção da saúde. É apontada a possibilidade de construção de um
espaço próprio e outras formas de organizar esse armazenamento, apesar da au-
sência desse espaço.
Em pesquisa realizada sobre a oferta e demanda de Educação Infantil no cam-
po, Leal e Ramos (2012, p. 174) constataram problemas enfrentados pelas escolas
com relação ao armazenamento e coleta do lixo, que não ocorrem de maneira re-
gular, destacando que tais problemas, além de interferirem no funcionamento das
escolas e afetarem as condições de higiene e saúde, também “parecem se relacionar
a uma questão mais ampla: a ainda insuficiente atuação do poder público no que
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diz respeito a políticas que assegurem a infraestrutura para a sobrevivência das
populações do campo”. Notadamente, a precariedade não se resume ao contexto
escolar, mas é generalizada ao contexto comunitário.
As autoras citadas ainda destacam situações diversas quanto à infraestrutura
dos prédios. Concluindo que, “na maioria dos municípios, as escolas necessitam de
reformas, com ampliação dos espaços, substituição de portas e janelas, além de
reparos de piso e teto, e pintura” (LEAL; RAMOS, 2012, p. 173-174). As crianças
da Escola B descrevem bem essa situação, conforme descrito no excerto a seguir:
Marina (10): - As portas têm as fechaduras esculhambadas.
Raíssa (9): - Uma vez eu, a Marina e vários alunos ficamos trancados na sala. O coordenador
fechou a porta e ela não abriu mais.
Ravi (9): - Foi. Aí precisou abrir com uma tesoura. A Ana Clara também trancou a gente. Ela
não sabia que a porta não abria, aí foi preciso chamar o diretor.
Raíssa (9): - E um dia desses nós ficamos trancados nessa outra sala bem aí.
Mediadora: E por que não pularam as janelas?
Raíssa (9): - Ah, porque nas salas não tem janelas.
Kelly (8): - Se tivesse janelas, era só pular. Mas não têm... Seria bom se tivesse.
As narrativas das crianças evidenciam uma situação que se estende há algum
tempo na escola, por falta de manutenção nas instalações do prédio. Outro aspecto
a ser ressaltado é a ausência de janelas nas salas, que nos leva a constatar que os
projetos arquitetônicos dos prédios não se coadunam com as necessidades peda-
gógicas das escolas. Janelas é um item essencial nesses projetos, tendo em vista a
necessidade de contato visual das crianças com o mundo exterior e mesmo pela im-
portância de se ter um espaço iluminado pela luz solar, arejado, ventilado. No caso
específico do problema das fechaduras das portas, ter janelas nas salas resolveria
em parte a dificuldade de abrir a sala em caso de ter pessoas trancadas.
Diversos outros problemas foram apontados pelas crianças na infraestrutura
das escolas, como banheiros pequenos, com chuveiros e vasos sanitários disputan-
do o mesmo espaço; vasos sanitários e pias que não funcionam e não se adequam à
altura das crianças da educação infantil. Os banheiros são um elemento do espaço
escolar que muito evidencia essa precariedade, por falta de manutenção nas insta-
lações. Além da ausência de banheiros adequados, as crianças apontam a falta de
espaços como biblioteca, salas de leitura e jogos, piscina, parquinho; muito mato
ao redor das escolas e insuficiência de árvores; pisos quebrados; calçadas altas
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e estreitas; muro rachado, prestes a cair; vidros das janelas quebrados; paredes
sujas; jardins sem a devida proteção das plantas, ocasionando situações de tristeza
nas crianças ao verem tais plantas pisadas, arrancadas, como aconteceu com um
espaço escolar muito apreciado pelas crianças da Escola A: a horta.
A horta foi um espaço organizado durante a execução de um projeto de exten-
são na escola, sendo criado e organizado com a participação efetiva das crianças,
por isso, é um espaço que lhes desperta afeição. Elas reconhecem a importância de
a escola ter uma horta, já que esta oportuniza a produção de alimentos saudáveis,
reduzindo, inclusive, gastos para a escola.
Consideramos a horta um espaço importante, sobretudo no contexto das es-
colas do campo, por contemplar especificidades do modus vivendi das populações
camponesas e, portanto, fortalecer a identidade do homem do campo. Na pers-
pectiva teórico-metodológica da Educação do Campo, possibilita a materialização
de alguns dos seus princípios, como a integração educação-trabalho, articulação
teoria-prática, aproximação entre conhecimentos escolares e saberes da cultura
camponesa. Em torno da horta, portanto, várias possiblidades pedagógicas, enfa-
tizadas pela Educação do Campo, podem ser ressaltadas: fortalecimento da iden-
tidade camponesa, contextualização do ensino-aprendizagem, materialização de
princípios da Educação do Campo e da Educação Ambiental, adoção de hábitos
alimentares saudáveis desde a infância, além do despertar um senso de responsa-
bilidade e cooperação na escola, que se estende para o fortalecimento dos vínculos
entre família, comunidade e escola.
Organização do ambiente educativo
A organização dos espaços e materiais está diretamente relacionada à infraes-
trutura, pois cada espaço existente na escola é potencializado pela forma como é
organizado, que se pretende que se leve em conta a intencionalidade educativa, vol-
tada para proporcionar a vivência de experiências múltiplas. As crianças da Escola
A pensaram a organização da escola desde a entrada do prédio, incrementando-a
com itens da natureza, como flores e árvores. Em muitos desenhos da escola, as
árvores ocupam espaço central, junto com outros elementos, no cenário imaginado.
Algumas crianças disseram ser importante que na escola tenha mais árvores,
porque “enfeitam”, “dá mais ar e sombra”, “ficaria mais frio por causa da sombra”
e “poderia ter umas árvores que dão flores”. Esse aspecto, que se refere a um am-
biente bonito, limpo, colorido, florido, arborizado, arejado, foi reiterado diversas
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Participação infantil na escola do campo: narrativas produzidas em contexto de pesquisa com crianças
vezes pelas crianças, tanto que esses espaços livres, com áreas verdes, foram os
mais fotografados. Esses são espaços que as crianças demonstram apreciar, porém,
ao conversarem sobre eles, sempre sugeriam mudanças que os qualificariam, na
visão delas.
As crianças prezam pelos detalhes, podendo contribuir em grande medida com
a organização dos espaços institucionais. Os adultos, com o olhar automatizado,
diminuem/perdem o senso de organização pelo excesso de atividades a que estão
submetidos, podendo ser auxiliados pelas contribuições criativas das crianças.
Como explica Sarmento (2011b, p. 44), esse processo criativo das crianças é tam-
bém reprodutivo, “isto é, nele se presentifica um passado histórico culturalmente
sedimentado e a inovação sempre inerente a toda a acção humana”.
As experiências vivenciadas pelas crianças aprimoram esse processo criativo,
como podemos verificar nas falas de Tadeu (8) sobre o reaproveitamento da água
utilizada para aguar as plantas, tendo em vista ter participado de ações de Educa-
ção Ambiental em projetos de extensão, sendo esta estratégia de reaproveitamento
uma das realizadas em parceria com as crianças: Tadeu (8): “- Eles podiam mudar
a caixa d’água de lugar, para onde ela estava antes e só instalar um cano para levar
a água para o lugar onde as mulheres lavam as coisas. Fazer que nem fizeram com
o bebedouro”. Ao que a Mediadora pergunta: “- Mudaram o bebedouro de lugar?”.
E ele responde: “- Não. Eles instalaram um cano e toda vez que derrama água, eles
aproveitam e ela vai para um pezinho de planta”.
O cuidado com a organização do ambiente educativo constitui-se importante
dimensão da qualidade da educação oferecida às crianças. Conforme estudos de
Silva e Luz (2012, p. 189), a configuração desses ambientes “pode favorecer ou des-
favorecer o sentimento de segurança, o desenvolvimento da autonomia das crian-
ças, valorizando suas práticas e as interações criança-criança e entre as crianças
e os adultos”.
É importante planejar pedagogicamente a organização dos espaços e mate-
riais visando à construção de um ambiente efetivamente educativo na escola. A
disponibilidade dos espaços e dos materiais interferem diretamente na riqueza ou
na escassez desse ambiente. Na pesquisa já citada, Leal e Ramos (2012, p. 174)
constatam que a maioria das escolas pesquisadas não possui mobiliário adequado
às crianças de 0 a 6 anos nem livros de literatura infantil, brinquedos, etc. “Dessa
forma, a ausência desses equipamentos apropriados não favorece um trabalho pe-
dagógico que permita, à criança, o seu desenvolvimento integral”.
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As crianças da Escola B deixam transparecer incômodo em relação à desor-
ganização dos espaços e materiais existentes. Inclusive, pensam num tipo de am-
biente educativo que assista melhor às crianças da educação infantil, com espaços,
materiais, tempos diferenciados. Em diversos momentos do grupo focal, elas tra
-
ziam a necessidade de organização do espaço da sala onde trabalhávamos. Com-
preendem que o ambiente educativo bem elaborado é condição para o bom fun-
cionamento da escola. Horn (2004 apud SILVA e LUZ, 2012, p. 189) pontua: “Os
espaços integram a dimensão pedagógica da escola, e sua adequação relaciona-se
com as possibilidades que ele oferece de ser transformado, de modo a proporcio
-
nar os meios para as experiências de crianças e adultos”. Em suas narrativas, as
crianças parecem compreender bem a dimensão pedagógica da escola. Elas fazem
críticas a materiais guardados, à dificuldade de acesso a eles, e à desorganização
de espaços e materiais.
A partir das interlocuções das crianças, diversas questões podem ser discuti-
das, como: 1) a consciência que têm as crianças de que está lhes sendo negado o
acesso a materiais que estão na escola para uso pedagógico e, no entanto, perma-
necem encaixotados ou à vista, mas indisponíveis para elas. A observação da Ma-
rina (10) esclarece: “- Não adianta ter os livros e a biblioteca e não poder pegar os
livros”; 2) a necessidade de organizar os materiais, pois da forma como estão, seja
guardados ou expostos, não podem permanecer. Como observa Kelly (8): “- Olha
bem aqui essa prateleira, toda horrível!”; 3) os gestores não investem no trabalho
de educar as crianças para cuidar do material, acreditando que negar-lhes o acesso
é a melhor estratégia. No entanto, pelos posicionamentos registrados, há evidên-
cias de que algumas crianças já formaram um comportamento adequado para esse
cuidado, como diz a Milane (8): “- Quando batesse o sinal, a gente vinha guardar de
novo”. O pensamento de Hendrick (2005, p. 49) traduz bem essa postura do adulto/
profissional responsável pela gestão da escola:
Deste modo, a personalidade é sempre associada à idade adulta. Já que as crianças não são
adultos, são excluídas de conjuntos de compreensões, tanto quanto é possível e desejável
em relações humanas. O que quero afirmar é que os adultos não sentem que têm de inves-
tigar a natureza das suas relações com crianças, já que a compreensão delas consiste na
falta de capacidade racional. Assim, facilmente se lhes nega a acção, privando-as, por isso,
de direitos civis como pessoas. Isto permite que adultos ponham as crianças – os sujeitos do
paternalismo – fora da definição de personalidade.
Vemos, portanto, que as crianças, como sujeitos concretos, possuem conheci-
mentos, desejos, opiniões próprias, que lhes possibilitam pensar a escola. Contudo,
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Participação infantil na escola do campo: narrativas produzidas em contexto de pesquisa com crianças
a postura adultocêntrica de diversos profissionais da educação lhes nega a possibi-
lidade de atuação ativa, entendendo-as como seres sem capacidade para participar
das decisões que lhes afetam ou com capacidade ainda em formação. Sendo assim,
as relações que esses adultos estabelecem com as crianças é ora de indiferença ora
de superproteção, acreditando que são eles que melhor definem aquilo de que as
crianças necessitam. Nos eixos temáticos seguintes, é possível adentrar nas ques-
tões acima pontuadas: negação de acesso a materiais; necessidade de organização
destes e postura adultocêntrica de profissionais da escola.
A perspectiva do direito nas vozes das crianças
Sarmento (2011b, p. 43) afirma que “as crianças, porque são crianças, vivem
um processo de desenvolvimento que as coloca numa particular relação de depen-
dência ante os adultos”. Porém, tal dependência não significa que não devam ser
reconhecidas e tratadas como sujeitos de direitos sociais; inclusive, a própria legis-
lação lhes assegura esse reconhecimento e diversos estudos e pesquisas compro-
vam a sua capacidade de participação em diferentes instâncias da vida social.
É evidente que, como diz o autor, “o seu modo de interpretar e significar o
mundo, sendo permeado pelas culturas nas quais se inserem, é marcado pela sua
condição biopsicológica e pelo estatuto social dependente em que se encontram”
(SARMENTO, 2011b, p. 43). As crianças esperam a proteção, o cuidado e a segu
-
rança que os adultos precisam lhes garantir, tanto é que em seus posicionamen-
tos tecem críticas muito contundentes aos adultos, mas entendem que esses são
imprescindíveis na organização e no funcionamento dos contextos institucionais.
Assim, “nas suas relações com os adultos e nas suas relações com outras crian
-
ças, partilham, reproduzem, interpretam e modificam códigos culturais que são
actualizados nesse processo interativo” (SARMENTO, 2011b, p. 44). Por mais que
muitos adultos não enxerguem isso, além de reprodutoras, elas são também pro
-
dutoras da cultura.
As crianças vivem um contexto histórico marcado pelo paradoxo do que delas
se espera: dependência e autonomia, ambos relativizados de acordo com a conve-
niência dos adultos. Na escola, não é diferente. Porém, em suas interlocuções, as
crianças demonstraram muita autonomia de pensamento, embora ainda demons-
trem um comportamento passivo devido aos constrangimentos e às interdições que
lhes impõe a governação adulta.
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As crianças têm consciência de que a merenda escolar constitui um direito
delas e um dever da escola nas palavras de Flávia (10), da Escola B: “- É obrigação
da escola oferecer merenda para os alunos. Tem alguns alunos que saem de casa
sem merendar, tem alunos que não têm dinheiro para comprar o lanche”. Repro-
vam com veemência notícias que têm de escolas cujo direito não é garantido. Elas
iniciam a conversa sobre a cantina atribuindo-lhe afeição, mas, ao conversarem,
vão demonstrando desapontamentos em virtude do não cumprimento do cardápio,
da diferenciação do que é servido nos turnos manhã e tarde (inclusive com desen-
tendimentos sobre este ponto) e da pouca qualidade das refeições. A preferência
é por carne, frango, mas o que prevalece é biscoito, pão, suco artificial, portanto,
alimentos industrializados.
Por mais que as escolas afirmem que na aquisição dos produtos que compõem
a merenda escolar cumprem o percentual de, no mínimo, 30% proveniente da agri
-
cultura familiar, vê-se que, pelas narrativas das crianças, são poucos os produtos in
natura oferecidos a elas, embora estejam num contexto cuja economia provém, basi
-
camente, da agropecuária. Portanto, a formulação de políticas públicas universais,
que não reconhecem as particularidades dos contextos e dos sujeitos a que se des
-
tinam, e a escassez de recursos destinados à educação como um todo no Brasil, são
problemas seculares que impedem o sucesso da escolarização das crianças no país.
Barbosa, Gehlen e Fernandes (2012, p. 76) defendem a necessidade de as políti
-
cas públicas gestadas pelo Governo Federal levarem em conta a “heterogeneidade de
modos de vida, da inserção nos processos produtivos e de seus universos simbólicos
e as diferentes identidades socioculturais da população residente no campo”. Sem
atender a esse critério, essas políticas nem sempre são divulgadas e enraizadas em
âmbito municipal. No caso do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE),
o valor per capita disponibilizado pelo Governo Federal é tão baixo (Creche: R$
1,07; Pré-escola: R$ 0,53; Ensino Fundamental: R$ 0,36) (MEC, 2017), que chega a
inviabilizar, muitas vezes, a determinação de incrementar a merenda com produtos
da agricultura familiar, fazendo com que os municípios optem por uma alimentação
não saudável, como produtos industrializados, por serem mais baratos.
As crianças não podem participar nem mesmo da escolha dos produtos que lhe
serão servidos na merenda escolar, mesmo que esta seja uma questão que lhes toca
diretamente. Mas, como observam Sarmento, Fernandes e Tomás (2007, p. 184): “O
confinamento da infância a um espaço social condicionado e controlado pelos adul-
tos produziu, como consequência, o entendimento generalizado de que as crianças
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estão ‘naturalmente’ privadas do exercício de direitos políticos”. E acrescentam:
“A infância é especialmente prejudicada, entre todos os grupos e categorias sociais
excluídas, quer pela relativa invisibilidade face às políticas públicas e aos seus
efeitos, quer porque é geralmente excluída do processo de decisão na vida colectiva”
(SARMENTO; FERNANDES; TOMÁS, 2007, p. 183).
É visível esse processo de exclusão das crianças e indiferença aos seus pontos
de vista. A escola, como instituição dedicada às crianças, poderia ser, antes de tudo,
um espaço/tempo de formação humana e cidadã. Tolher as crianças de participar,
de ser consultada e de expressar pensamentos é negar-lhe o direito à cidadania.
Além da merenda escolar, outras situações provocaram indignação das crianças
em relação a esse aspecto do direito, como jogos que ficam trancados em armários
e, com os quais elas não podem brincar.
Desconfiamos que a natureza questionadora das crianças desestabiliza as cer-
tezas de muitos adultos, que as afastam de qualquer possibilidade de emitirem
opiniões sobre o funcionamento institucional. Hendrick (2005, p. 48) enfatiza que
apenas a superação da mentalidade do adultismo possibilitará “ouvir um conjunto
mais autêntico e, provavelmente, mais inquietante de vozes – porque haverá cer-
tamente muitas ocasiões em que as crianças contestam e contradizem as nossas
visões”. Por outro lado, alguns professores aguçam a criticidade das crianças ao
compartilhar com elas situações constrangedoras a que são submetidos, mostran-
do dificuldades de acesso a materiais importantes do ponto de vista pedagógico.
Assim, as crianças refletem e concluem que elas também são constrangidas pe-
los obstáculos que são colocados para que tenham acesso a brinquedos, jogos, por
exemplo.
Ao analisar diversas posições de teóricos sobre a participação política das crian-
ças, Qvortrup (2010b, p. 779) questiona: “Deveríamos fazer de tudo para proteger
as crianças ao preço de deixá-las fora da ‘sociedade’ ou deveríamos reconhecê-las
como pessoas, participantes, cidadãs com o risco de expô-las às forças econômicas,
políticas, sexuais [...]?”. Continuamos defendendo que o confinamento das crian-
ças em instituições não deve mais servir para segregá-las, tirando-lhes o direito a
exercer o papel de ator social, como aconteceu nos primórdios da escola de massas.
Corroboramos, portanto, o pensamento de Qvortrup (2010b, p. 779-780): “De fato,
ninguém está disposto a sacrificar a necessária proteção das crianças expondo-as a
todos os riscos de uma sociedade moderna; porém, ninguém concordaria em privar
as crianças de se experimentarem como pessoas que contribuem para a sociedade”.
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Oportunidades de pesquisa tendo as crianças como coparticipantes demons-
tram que não há motivos para se negar tal experimentação, pois as crianças consti-
tuem um coletivo que pensa os espaços institucionais com bom senso e criticidade.
As crianças têm discernimento suficiente em diversas questões e conseguem, no
coletivo, lançar um olhar escrutinador, sensível e crítico para diversas dimensões
do ambiente escolar, já que este é fonte de experiências cotidianas que as constitui
como pessoas inseridas socialmente.
O espaço micro da sala de aula
A sala de aula é o espaço escolar dentro do qual as crianças passam a maior
parte do tempo em que permanecem na escola. Petschen (apud BENITO, 2017,
p. 33) considera que os estudos sobre as instituições escolares deveriam destinar
maior atenção a esse microcontexto, que ele define como uma mescla de “lógica,
magia, drama e retórica”. Realmente, nos momentos em que conversávamos sobre
as aulas, as crianças explicitaram muitos aspectos que merecem uma detida refle-
xão, em narrativas densas, carregadas de afetos em relação às práticas dos profes-
sores, aos componentes curriculares, ao conhecimento, às relações com os pares.
Diversos elementos podem ser retirados para análise da escola na perspectiva
das crianças, o que vai ao encontro das recomendações de Benito (2017, p. 35):
acontecimentos triviais que se sucedem durante as aulas permitem compreender
a escola, pois “sob essas banalidades, subjaz não apenas um sistema estruturado
de sociabilidade, mas toda uma cultura”. Como agentes produtores dessa cultura,
junto a seus professores e professoras, as crianças nos permitiram uma visão pri-
vilegiada da sala de aula, ao voltarem seus olhares para os sujeitos, os objetos e as
ações, categorias fundamentais.
Apesar das contradições apontadas ao falarem sobre a escola, elas demons-
traram, em diversos momentos das interações nos grupos focais, compreenderem o
papel desta instituição, considerando-a importante para sua formação, como espa-
ço de acesso ao conhecimento, mas também de socialização, como disserta Marília
(10), da Escola B: “- A melhor coisa do mundo é a escola, porque a gente aprende
mais coisas, a ler, a respeitar, a educar. Tipo quem quer ser professora aprende
a ser professora”. Essa ênfase na formação profissional foi reiterada também por
Murilo (9), da Escola A: “- Meu sonho é estudar para ser veterinário”. As crianças,
portanto, têm sonhos para o futuro que esperam que a escola possa contribuir para
sua consecução.
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Outro aspecto ressaltado é a amizade com professores e com seus pares (An-
dré (8): “- O que eu mais gosto é de ficar aqui junto com meus colegas e com meus
professores.”), embora destaquem também afetos negativos em relação a alguns. Ao
tempo em que elogiam o tratamento atencioso e carinhoso que recebem de alguns
professores, algumas crianças também reprovam atitudes de outros docentes, prin-
cipalmente porque brigam muito em sala de aula com os alunos. O professor legal,
na concepção das crianças, é aquele que sabe explicar os conteúdos, que propõe
atividades mais lúdicas, com jogos, desenho, pintura, etc., e, claro, que “sabe respei-
tar os alunos”, como diz Flávia (10). Gallego e Silva (2011, p. 43) lembram “que os
alunos produzem avaliações sobre os professores e informalmente, com frequência,
associam características pessoais, como responsabilidade, paciência, dedicação,
empenho etc., a competências ‘técnicas’, como o conhecimento ou a atualização”.
As aulas de Artes foram muito citadas pelas crianças como as preferidas, e
as práticas tradicionais de cópia e de memorização foram bastante criticadas por
elas. Oliveira-Formosinho (2007, p. 13) alerta para propostas que “criam alguma
ressonância ao nível da retórica da política educativa, [mas que] nunca consegui-
ram penetrar a carapaça burocrática que protege a pedagogia tradicional, ou seja,
nunca conseguiram transformar a esfera praxiológica”.
As crianças questionam práticas docentes que se resumem a escrever no qua-
dro, outras que os deixam ociosos depois que concluem a tarefa solicitada. Que-
riam mais inovações nas aulas para não ficar sem fazer nada: “brinquedos, jogos,
livros”. Oliveira-Formosinho (2007, p. 13) denuncia “a persistência de um modo
de fazer pedagógico que ignora os direitos da criança a ser vista como competente
e a ter espaço de participação (o modo pedagógico transmissivo ou a pedagogia
transmissiva), não por falta de pensamento e propostas alternativas”. É preciso
problematizar as práticas para que sejam transformadas numa perspectiva que
contemple as crianças, seus desejos, anseios, necessidades e potencialidades, além
de seus direitos.
As próprias crianças, em suas interlocuções, dão ideias de como mobilizar os
alunos nas aulas: Flávia (10): “- Eu queria que tivesse mais aulas-passeio para o
Monumento do Jenipapo, Museu, Zoológico, Parque. Tinha uma professora aqui
que fazia jogos, brincadeiras, era bom demais”; Jeane (9): “- As professoras não
levam mais livros infantis para as salas, porque pensam que a gente não é mais
criança; Ravi (9): “- Os professores levam só o livro, pincel, caneta e estilete. Passa
a atividade do livro ou para escrever no caderno. Às vezes escreve muito no quadro.
Era bom se tivesse aula-passeio. Seria bom ir para o zoológico”.
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Um aspecto positivo, conectado com as necessidades das crianças, é o dia de
jogos educativos, citado por Amália (9), da Escola A. Cumpre destacar que a Edu-
cação em Tempo Integral, que tem lugar na Escola B, vai em direção desse caráter
mais lúdico, pois as crianças têm a oportunidade de desenvolverem outros tipos de
atividades que não sejam apenas focadas no cognitivo. Na Escola A, as crianças
sentem saudade do tempo em que esse Programa Federal foi implantado na escola,
como enfatiza Vívian (8), em outro momento do grupo focal sobre a escola: “- Tia,
para melhorar, poderia ter aula em que todos podem participar. Tinha aula de balé
na escola e só podia participar as meninas. E futebol para meninos. Capoeira para
meninos e meninas. Já teve, mas não tem mais. Quando acabou o ano, os professo-
res não vieram mais”.
Há aspectos universais que caracterizam o ser criança, conforme Sarmento
(2003): a fantasia, a criatividade, a interatividade, a ludicidade. Por isso, a novida-
de as fascina, e a escola deveria considerar isso ao organizar seus espaços, tempos,
atividades pedagógicas. Em suas falas, as crianças deixam clara a necessidade
de propostas mais desafiadoras e lúdicas, inclusive imaginando cenários para o
ambiente escolar tomando por base escolas vistas em programas televisivos, como
retrata Flávia (10), da Escola B, em uma de suas falas: “- Meu sonho é estudar
numa escola que tivesse freira, um quarto para a gente dormir, tinha aula de músi-
ca, jogos,...”. Mediadora estranha e questiona: “- Freira?”. Ao que ela responde fir-
memente: “- Sim”. E Jeane (9) ajuda a explicar: “- É que nem a da novela Carinha
de Anjo, né Flávia?”.
Na contemporaneidade, é inegável a transformação dos cotidianos das crianças
por efeito dos meios de comunicação e informação. As crianças da Escola A também
narram seus desejos de terem acesso a inovações tecnológicas, como sugere Tadeu
(8): “- Sabe qual é meu sonho? Meu sonho é que a escola coloque internet, que a gente
use as tecnologias para estudar”. O sonho da criança nos remete à observação de
Sarmento (2011a, p. 595) de que, atualmente, a escola “é compungida a incorporar
as tecnologias de informação e comunicação no seu programa institucional, procu-
rando evitar a desvalorização do seu capital simbólico”.
A própria atividade de pesquisa comprova a atração das crianças pela novida-
de. Elas demonstraram muita satisfação em fotografar espaços, dar suas opiniões,
expressar seus pontos de vista e desenhar. Em suas falas deixam transparecer, com
nitidez, que desenhar é uma atividade muito prazerosa e, falar dos desenhos, ao
mesmo tempo em que causa timidez em algumas crianças, todas exprimem felici-
dade por expressarem suas ideias.
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Participação infantil na escola do campo: narrativas produzidas em contexto de pesquisa com crianças
As crianças da Escola A reiteram, ainda, em suas narrativas, problemas que
atrapalham a aprendizagem, como a falta de condições materiais das salas de aula
e a indisciplina de alguns de seus pares, como André (8) relata: “- Tia, o quadro
da sala está manchado, poderia mudar para melhorar as aulas e o ventilador não
presta, e o armário está todo quebrado. Eu também não gosto quando meninos
ficam pulando a janela da escola. Tem vezes que a professora briga e bota para a
diretoria”. Esta situação é reforçada por Murilo (9): “- Uma coisa que eu não gosto
também é da bagunça. Tem uns meninos que jogam cadeiras no chão. E os profes-
sores e o diretor não fazem nada”.
A indisciplina de colegas é muito recorrente nas falas das crianças, nas duas
escolas, a ponto de Danilo (8), da Escola A, dizer que o que menos gosta nas aulas
é de um colega, que “é muito atentado e fica caçando conversa o tempo todo”, su-
gerindo, inclusive, que ele seja tirado da sala de aula para melhorar as aulas. E
na Escola B, Flávia (10) relata: “- Professora, têm alunos que brigam na sala e a
professora fica sorrindo”. Também Jeane (9) demonstra incômodo com esse tipo de
comportamento de alguns colegas durante as aulas: “- Os meninos poderiam fazer
menos barulho, jogar os papeis no lixo. Às vezes, a tia está escrevendo e os meninos
jogam a atividade no lixo. A tia manda eles escreverem de novo”.
As crianças externam representações sociais do que seja o mau e o bom aluno,
sendo este último aquele que se adequa às normas institucionais. Gallego e Silva
(2011, p. 34-35) chamam a atenção para problemas recorrentes nas aulas, deriva-
dos da cristalização de práticas incorporadas do ensino simultâneo instituído no
final do século XIX no Brasil, que tentam homogeneizar o que é diverso:
Cópias, ditados, leituras, exercícios sempre para todos da turma e a serem feitos ao mesmo
tempo no mesmo ritmo! Quem não consegue é lento, portanto atrapalha. Quem vai rápido
demais, também atrapalha! O ideal é ao mesmo tempo, sem momentos vazios e ociosos,
pois o término antecipado gera bagunça e os lentos promovem igualmente a desordem!
Ao passar por isso como alunos é esse modelo que incorporamos e nos serve de referência
quando assumimos a profissão docente.
As crianças consideram que as relações interpessoais no ambiente escolar de-
vem ser trabalhadas para que se tornem melhores, e esperam que os adultos assu-
mam a função de intervir para proporcionar essa melhoria. Chamamos a atenção,
ainda, para uma fala de Tadeu (9), da Escola A: “- Eu queria que as salas fossem
maiores e não precisasse os alunos serem transferidos para outras escolas”. Inclu-
sive, em seu desenho da escola, ele produziu uma arte na qual esta instituição era
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muito grande e, ao falar sobre seu desenho, ele disse: “- Nessa escola, cabem cinco
mil alunos, para que nunca os alunos tenham que mudar de escola”.
Delalande (2011, p. 73), em suas pesquisas sobre a escola, tendo crianças como
interlocutoras, também detecta, por parte dessas, “uma impaciência ao deixar uma
escola e um grupo de crianças que se conhecem muito bem, associado ao medo do
desconhecido e dos grandes colégios”. É, portanto, importante que a escola pense
em estratégias para que essa transição de uma escola para outra seja mais tran-
quila. A autora francesa, com base nessa dificuldade apresentada pelas crianças,
associou a pesquisa à realização de uma oficina, cujo objetivo foi realizar um pe-
queno jornal a ser divulgado entre os alunos do último ano de uma escola e os da
outra escola, que estudavam na série em que aqueles ingressariam no ano seguin-
te, “a fim de que os primeiros se beneficiem dos testemunhos de seus predecessores
e que os alunos jovens do colégio constatem que eles vivem, uns e outros, emoções
e acontecimentos comuns em torno da sua iniciação ao colégio” (DELALANDE,
2011, p. 75).
Diante das análises dos eixos temáticos, reafirmamos a importância de se
olhar para as possibilidades de ação das crianças, planejando, no coletivo, formas
de considerá-las no contexto da prática pedagógica. Caldart (2015) esclarece que a
luta do movimento de Educação do Campo deve ser por uma escola comprometida
com as crianças e com as suas experiências e aprendizados, o que alarga a visão
sobre o papel formativo desta instituição educativa. No entanto, as análises aqui
apresentadas colocam-nos diversos desafios no sentido de materializar os princí-
pios da Educação do Campo e os pressupostos da Sociologia da Infância, em defesa
de uma escola no/do campo que respeite e reconheça, em suas práticas, os direitos
das crianças.
Considerações nais
A discussão em torno dos sentidos produzidos pelas crianças camponesas so-
bre a escola do campo revelou a capacidade que possuem para analisar o contexto
institucional, apontando contradições e propondo estratégias de melhoria das prá-
ticas que nele se desenvolvem. É possível afirmar que, se as crianças forem ouvidas
com respeito e atenção, poderão contribuir de modo significativo para fortalecer a
instituição escolar como espaço de formação humana, de aprendizagem e de de-
senvolvimento do protagonismo infantil. Assim, é preciso redefinir os papeis atri-
buídos às crianças e por elas assumidos, no bojo da escola e das práticas docentes.
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Participação infantil na escola do campo: narrativas produzidas em contexto de pesquisa com crianças
As análises empreendidas revelaram que, na escola, ainda estão cristalizados
pensamentos e práticas que traduzem uma concepção de criança como ser da fal-
ta, da incapacidade, por isso lhes são interditados a atuação ativa, o exercício da
cidadania, dentro das possibilidades que possuem. No entanto, ao pensarem a es-
cola, demonstraram firmeza em seus posicionamentos em relação à forma como os
espaços e materiais estão organizados, que afetam diretamente no tipo de relações
que são construídas e vivenciadas. Além disso, evidenciaram que têm consciência
do que lhes é de direito e que, porém, lhes é negado.
Nesse sentido, o estudo comprovou o potencial que as crianças possuem para
a participação social, no sentido de serem efetivamente inseridas em instâncias
decisórias na escola, sendo urgente o reposicionamento delas como sujeitos que
pensam e contribuem para a (re)construção do ambiente educativo.
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