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ESPAÇO PEDAGÓGICO
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Literatura infantil digital: leitura na tela e novas formas de socialização na escola
v. 28, n. 1, Passo Fundo, p. 221-236, jan./abr. 2021 | Disponível em www.upf.br/seer/index.php/rep
emoção, assim, os sentimentos influem na imaginação, e esta, nos sentimentos; iv)
a imaginação pode representar algo inteiramente novo, e esta imagem, convertida
em objeto, influir na realidade.
A possibilidade de encontro com o outro por meio da linguagem literária per-
mite a construção de imagens e cenas mentais, ampliando a relação do homem com
o mundo. Nesse circuito, há ainda a emoção, que se manifesta nesse trânsito entre
realidade e ficção. A lei da dupla expressão dos sentimentos, proposta pelo autor,
parte do pressuposto de que o nosso estado emocional influencia de forma direta
a nossa experiência. Assim, as emoções são expressas na linguagem, na nossa or-
ganização de ideias, e também no corpo, através de reações de ordem física. Esse
tom afetivo, emocional, ao alterar a imaginação, altera também a nossa relação
com a realidade. É isso que faz com as emoções experimentadas no encontro com a
ficção tornem-se reais. A ficção influencia os “nossos sentimentos e, a despeito de
essa construção por si não corresponder à realidade, todo sentimento que provoca é
verdadeiro, realmente vivenciado pela pessoa, e dela se apossa” (VIGOTSKI, 2009,
p. 28). Assim, o medo do monstro, provocado pelas ilustrações ou pela leitura de
um texto, torna-se completamente real, como foi apontado no instante por Bento.
As conexões das crianças mostraram-se também interdiscursivas. Vemos de
forma explícita a relação com outras linguagens e referências. Seus pressupostos
sobre monstros trazem discursos do filme dos Minions e do desenho do Scooby-Doo.
Pedro, Bento e Antônia anunciam seus saberes sobre vampiros e misturam reali-
dade e fantasia em suas enunciações, associando a imagem do morcego como ani-
mal predador que “come mosquito para proteger a gente” e também como vampiro.
Dizem com gestos e palavras o que sabem sobre esse monstro: experimentam seu
movimento de sumir e aparecer com a capa, relacionam os “dentes afiados” à ação
de sugar o sangue humano, anunciam que ele “não gosta de alho e ele morre com
a luz” e que, quando morre, “vira terra” / “vira poeira” / “vira terra-poeira”. Uma
negociação de sentidos construída de forma dialógica, pautada na reação de uma
palavra a outra palavra (BAKTHIN, 2011). Uma brincadeira com a linguagem, que
faz com que Antônia busque explicar o seu pensamento na imagem vista na tela,
num desenho animado, chegando a conclusão de que os vampiros, quando extermi-
nados, transformam-se em “farelinhos do fogo”.
A leitura do aplicativo e a socialização discursiva, entretanto, desconstruíram
a ideia inicial de que todos os monstros são assustadores. A ilustração, o traço
cômico apresentado na tela, divertiu as crianças. Como apontou Vitória, “estava
tudo desenhado, então não deu medo”. Observamos assim que a imagem é capaz