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ESPAÇO PEDAGÓGICO
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O que é educar um bebê? Os primórdios da estruturação psíquica dentro da instituição escolar
v. 28, n. 2, Passo Fundo, p. 609-621, maio/ago. 2021 | Disponível em www.upf.br/seer/index.php/rep
ponto de partida para a educação como um ato de transmissão inventivo de um
saber-fazer subjetivado e subjetivante.
Educar é muito mais do que instruir. É ato de sustentar a criação de uma
criança (JERUSALINSKY, 2011) e, nesse sentido, não pode ficar reduzido a um ex-
perimento que tome o bebê como objeto no qual se pretende inculcar a positivação
de uma produção pela aplicação de um procedimento padronizado para gerar obe-
diência. Esse afã para que coma, durma, obedeça, fale, conte, etc., frequentemente,
instaura um atropelo da condição do bebê como sujeito em estruturação que possa
vir a desejar tais realizações (JERUSALINSKY, 2014), como consequência de uma
identificação amorosa com os outros e, portanto, com a transmissão de seus ideais.
Para articular a educação à estruturação do bebê como sujeito do desejo, não
basta “querer que o bebê faça”, é preciso “desejar que o bebê deseje”. Há um giro
a mais nessa transmissão entre gerações imprescindível à transmissão da falta
e do desejo, que costuma ser elidida em métodos do comportamento que miram,
em linha reta, na obtenção de resultados por submissão do bebê a procedimentos.
Diante deles, as contribuições psicanalíticas ao campo da intervenção com bebês
em estimulação precoce vêm nos lembrar que a educação implica, de modo amplo,
a transmissão de uma falta e, somente sobre o rastro deixado por esta, um norte
capaz de vetorizar o desejo na direção de possíveis realizações de ideais culturais.
É aí que a educação se inclina na direção de uma experiência formadora para todos
os nela implicados.
Se a redução do ato educativo a técnicas adaptativas aparece sublinhada no
discurso social, produzindo consequências no laço pais-bebê, ela pode se ver forte-
mente recrudescida desde uma realidade na qual muitos bebês, mesmo que inseri-
dos em uma família, têm uma vida institucionalizada, já que passam a maior parte
de seus dias dentro da instituição educacional.
O psicanalista Bruno Bettelheim (1967, p. 70-71), em A fortaleza vazia, apon-
ta que, ao se lançar cedo demais um bebê à rigidez de rotinas, “empurrando-o a fa-
zer coisas” que os adultos querem que ele faça, instaura-se uma destrutividade no
desenvolvimento que subjuga o bebê, primeiramente aos adultos que lhe exigem e,
posteriormente, à sua própria ansiedade, o que acaba por produzir “personalidades
vazias e compulsivas”. Diante disso, é preciso compreender a educação nessa etapa
da vida como a possibilidade de dar lugar a experiências de prazer, por meio das
quais se cultive o ensejo, o broto do desejo de realizações da cultura nesse pequeno
ser, ao mesmo tempo tão fragilmente exposto e cheio de potências. Quando uma
mãe cuida de seu bebê, introduzindo brincadeiras prazenteiras, de cosquinhas, bei-