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ESPAÇO PEDAGÓGICO
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A escuta crítica e o aspecto dialógico da educação moral: a concepção de J. F. Herbart do professor como guia moral
v. 28, n. 3, Passo Fundo, p. 905-928, set./dez. 2021 | Disponível em www.upf.br/seer/index.php/rep
mesma, para os outros e para os objetos. Para ver mais sobre essas noções, ver Herbart (1902b, p. 210-259) e
Herbart (1851). Para uma discussão mais aprofundada dessa ideia, ver Dietrich Benner (2007, p. 146-167).
8 Ver Benner e English (2004).
9 É importante notar que neste ensaio estou fazendo uma mudança significativa na tradução padrão deste
termo. Traduzi o termo de Herbart, Zucht, como “orientação moral”, em vez de usar a tradução padrão de
Zucht como “disciplina”. Herbart referiu-se a formas de ação pedagógica que impedem uma criança de agre-
dir fisicamente a si mesma ou aos outros de governo (Regierung), que é vertido na tradução padrão como
“governo”, mas na minha opinião é mais apropriadamente traduzido como “disciplina”. Herbart diferencia
disciplina (Regierung) da educação moral. Enquanto a disciplina se concentra nos resultados das ações dos
alunos com o objetivo de impedir que os alunos prejudiquem a si mesmos ou aos outros, a educação moral se
concentra na compreensão do pensamento por trás das ações dos alunos, uma tarefa que podemos chamar
de orientação moral (Zucht) (HERBART, 1902b, p. 233). Herbart viu a disciplina como pré-condição indis-
pensável para a educação formativa; no entanto, ele observou que não faz parte da verdadeira educação
porque só funciona negativamente para evitar danos, e não deve ter uma influência formativa intencional.
Herbart se referiu à tarefa do professor no desenvolvimento do caráter moral como Zucht. O termo Zucht
vem do verbo alemão ziehen, que significa extrair. Essa ideia de prática educacional como Zucht descreve
uma forma de educação que tem um efeito formativo no desenvolvimento do caráter moral dos alunos, e é
por isso que afirmo que o conceito é melhor abordado em inglês como “orientação moral”.
10 Para estender a crítica de Herbart, podemos acrescentar que muitos dos exemplos de Rousseau são basea-
dos em situações planejadas e, até certo ponto, manipuladoras, destinadas a fazer com que Émile tenha a
experiência de aprendizado “correta”. Veja, por exemplo, como Émile é ensinado a não ter medo de másca-
ras e outros objetos assustadores. Para uma discussão sobre a concepção de medo de Rousseau, ver Andrea
English e Barbara Stengel (2010). A liberdade que Rousseau (1979, p. 63) imaginou para o educando é
mostrada em sua ideia de que na primeira infância a criança não deveria ter permissão para desenvolver
hábitos fixos: “o único hábito que a criança deve adquirir é nenhum hábito”. Esse ponto é importante
também para Herbart, que concordou com Rousseau que a criança não deveria ser habituada desde cedo a
pensar ou agir de certas maneiras, porque, segundo ele, isso limita os interesses da criança mais tarde, na
vida. Para uma análise da concepção de escuta de Rousseau na educação, ver Megan J. Laverty (2011).
11 Em um ensaio posterior, Herbart acrescentou que, enquanto a imagem de Rousseau do educador é muito
centrada na educação de uma única criança, professores que estão mais preocupados em ter muitos estu-
dantes ao seu redor do que em educá-los, perdem a nuance mais fina do relacionamento educacional. As
visões de Herbart são parte de sua crítica às escolas. Ele acreditava que as escolas estavam restringindo
as relações educativas que podem ser formadas entre professores e alunos e advertiu que, se os professo-
res não tiverem tempo e oportunidade adequados para formar esses relacionamentos, eles, por sua vez,
perderão o desejo de cultivar tais relacionamentos. Tal observação se aplica à situação escolar de hoje. Ver
Johann Friedrich Herbart (1964, p. 143-151).
12 Ver Herbart (1902b, p. 213) e o seu conceito sobre a instrução educativa diversificada.
13 Para a descrição completa dessas ideias, ver Herbart (1902b, p. 242-250).
14 Embora existam algumas semelhanças entre a ideia de diálogo de Herbart e a teoria da clarificação de
valores proposta por Louis Raths, Merrill Harmin e Sidney Simon (1966, p. 28, 47, 72) – como a impor-
tância de apresentar alternativas ao educando – existem também diferenças importantes. Uma análise
detalhada está para além do âmbito deste ensaio; no entanto, uma distinção central entre a teoria do diá-
logo professor-aluno de Herbart e a teoria da clarificação de valores é que esta última enfatiza o processo
de valorização sobre o seu produto. A teoria dos valores propõe que o professor não pretende que os alunos
vejam quaisquer valores particulares como importantes; pelo contrário, o professor é relativamente neutro
em termos de valores, apenas ajudando os alunos a “clarificar” aquilo em que acreditam e valorizam na
fase atual da sua vida, sem os ajudar a mudar valores problemáticos. (Se o professor permanece ou não
verdadeiramente neutro em termos de valor neste modelo é outra questão para deliberação). Este modelo
parece não ter o objetivo de engajar os alunos na crítica de seus próprios interesses de ocupação consigo
mesmo e de colocar os alunos em conflito consigo mesmos nessa base. Dessa forma, o esclarecimento de va-
lores pode ter por objetivo ajudar os alunos a compreenderem a si mesmos, mas não tenta explicitamente
ajudar os alunos a transformarem sua autocompreensão através da autocrítica de acordo com as relações
morais estabelecidas nas ideias éticas, que é o aspecto central da orientação moral aqui desenvolvida.