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ESPAÇO PEDAGÓGICO
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Celso Ilgo Henz, Patrícia Signor, Ivani Soares
v. 27, n. 3, Passo Fundo, p. 750-775, set./dez. 2020 | Disponível em www.upf.br/seer/index.php/rep
proibição se verifica seja, em si mesma, uma violência” (FREIRE, 2016c, p. 58).
Acostumados com o desamor e o silenciamento opressor, não aprendemos o amor
e o “dizer a sua palavra”. Nesse estágio, nosso “ser de atenção consciente”, aquele
que “está no coração de nosso ser no mundo e de nossa capacidade de existir, conec-
tado com nós mesmos e com nosso ambiente humano e natural” (JOSSO, 2010b,
p. 75), encontra-se desconectado, adormecido. Nossa desconexão e inconsciência
por não conhecermos outra realidade, no entanto, não faz com que a situação seja
menos real. Com o passar do tempo, ao longo de nossa existência, fragmentos de
lucidez irão manifestar-se, “colocando em cena um sujeito que embora ainda não se
reconheça sempre como tal, age sobre situações, reage a outras, ou, ainda, deixa-se
levar pelas circunstâncias” (JOSSO, 2010, p. 91); as realidades, por mais condi-
cionantes que sejam, não estão determinadas a serem imutáveis, e nossa vocação
enquanto seres humanos é ousar sempre em inéditos viáveis na busca pelo Ser
Mais gente: nossa vocação ontológica.
Passamos agora a falar um pouco sobre o sentir/pensar/agir do ser huma-
no Paulo Freire. Para começar, pegamos emprestadas as palavras de seu amigo
pessoal, estudioso e companheiro de jornada, Moacir Gadotti (GADOTTI, 2007,
p. 23), quando afirma que Freire: “Era uma pessoa bondosa, generosa, solidária.
Ele queria bem às pessoas, falava bem delas, era sempre ético, positivo e respeitoso
para com todos e todas. Todos os títulos dos seus livros são positivos, esperançosos,
mesmo quando escritos com indignação”; e prossegue, “ele escrevia para as pessoas
que amava, por isso, tudo o que escrevia deveria pertencer àqueles para os quais
ele o havia feito: os oprimidos. Por isso não se incomodava em ver alguns de seus
escritos reproduzidos sem consulta prévia” (GADOTTI, 2007, p. 23).
Complementamos as palavras de Gadotti com o que disse o autor do mais fa-
moso prefácio das obras de Freire, Ernani Maria Fiori, que também acompanhou
a jornada de luta do educador pela educação e pela libertação com os oprimidos.
Ao apresentar uma das obras mais traduzidas do mundo, a Pedagogia do Oprimi
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do, Fiori caracteriza Freire como um educador comprometido com a vida, que não
produz ideias, e sim pensa existências. Afirma que seu esforço se concentra em
pensar a práxis
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humana na busca de sua interioridade, totalizando-a como uma
busca pela libertação. Fiori traduz a luta de Freire como uma luta em favor dos
oprimidos, na busca constante da vocação ontológica do ser mais; e declara, ainda,
que Freire não ensina a repetir palavras, não se restringe a desenvolver a capa
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cidade de pensá-las segundo as exigências lógicas do discurso abstrato; simples-
mente, coloca o alfabetizando em condições de poder (re)existenciar criticamente