ESPAÇO
PEDAGÓGICO
DIÁLOGO COM
EDUCADORES
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Cláudio Almir Dalbosco, Odair Neitzel
v. 28, n. 3, Passo Fundo, p. 1174-1188, set./dez. 2021 | Disponível em www.upf.br/seer/index.php/rep
Os clássicos e a educação atual: entrevista com Rainer Bolle
Cláudio Almir Dalbosco*
Odair Neitzel**
Introdução
A Revista Espaço Pedagógico (REP), no presente dossiê sobre o pedagogo ale-
mão Johann Friedrich Herbart, oferece aos leitores uma entrevista com o prof. dr.
Reiner Bolle, o qual é nada mais nada menos do que o atual presidente da presti-
giosa Sociedade Internacional Herbart (Internationale Herbart Gesellschaft). Com
sede na Alemanha, a referida sociedade desenvolve amplas atividades acadêmicas
e científicas sobre esse autor clássico da pedagogia alemã.1
Reiner Bolle estudou teologia católica, pedagogia e filosofia para professor gi-
nasial na Universidade de Münster, onde também se doutorou em 1988. Na condi-
ção de professor assistente na Universidade de Hamburgo, escreveu seu trabalho
de habilitação sobre Jean-Jacques Rousseau, do qual resultou o livro Jean-Jac-
ques Rousseau. O princípio da perfectibilidade do ser humano pela Edukation e
a pergunta pela conexão entre liberdade, felicidade e identidade (Jean-Jacques
Rousseau. Das Prinzip der Vervollkommnung des Menschen durch Edukation und
die Frage nach dem Zusammenhang von Freiheit, Glück und Identität). Depois de
muitos anos de atividade como professor na escola Sophie-Barat (Sophie-Barat-S-
chule), assume vaga de concurso em 2002 na Pädagogische Hochschule Karlsruhe,
como professor de Pedagogia Geral, disciplina que ainda ministra até hoje. Além de
presidir a Sociedade Internacional Herbart, o prof. Bolle possui uma vasta publica-
ção acadêmica em livros, capítulos de livros e ensaios em periódicos nacionais e in-
ternacionais. Cabe destaque, dentre sua produção científica, além do referido livro
sobre Rousseau, também para a obra por ele organizada em parceria com Gabriele
* Doutor em Filosoa pela Universidade de Kassel. Professor e pesquisador no Programa de Pós-Graduação em Educação
da Universidade de Passo Fundo (UPF). Orcid: https://orcid.org/0000-0003-3408-2975. E-mail: vcdalbosco@hotmail.com
** Doutor em Educação (UPF/Universität Kassel). Professor Adjunto na Universidade Federal Fronteira Sul (UFFS) – Cam-
pus Chapecó. Docente nos Programas de Pós-Graduação em Educação e Filosoa (PPGE/PPGFIL). Líder do Grupo de
Pesquisa Educação, Filosoa e Sociedade (GPEFS). Orcid: https://orcid.org/0000-0001-8121-1149. E-mail: odair.neitzel@
us.edu.br
Recebido em: 13/12/2021 – Aprovado em: 13/12/2021
http://dx.doi.org/10.5335/rep.v28i3.13254
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Weigang, intitulada Johann Friedrich Herbart 1806-2006. 200 anos da Pedagogia
Geral. Impulsos histórico-efetuais (Johann Friedrich Herbart – 1806-2006. 200
Jahre Allgemeine Pädagogik. Wirkungsgeschichtliche Impulse). Participam desta
coletânea, como autores de capítulo, grandes especialistas internacionais do pensa-
mento de Herbart, entre os quais, Klaus Prange e Rotraud Coriand.2
Elaboramos as perguntas inicialmente em alemão e as enviamos ao prof. Bol-
le, via correio eletrônico, no dia 26 de janeiro de 2021, o qual nos retornou, também
eletronicamente, em 7 de abril de 2021. Na sequência, procedemos com a tradução
da entrevista e, posteriormente, fizemos-lhe novas consultas de esclarecimento.
É preciso salientar, contudo, que o primeiro contato com o referido entrevistado
ocorreu pessoalmente, ainda em janeiro de 2015, quando um dos entrevistado-
res, Cláudio Almir Dalbosco, proferiu conferência sobre Jean-Jacques Rousseau
na Pädagogische Hochschule Karlsruhe (Alemanha), contando com a prestigiosa
presença do próprio prof. Bolle. Depois disso, os vínculos continuaram por meio da
Internationale Herbart Gesellschaft, com acesso frequente à sua vasta produção
científica.3
A entrevista abre um leque de temas educacionais, revelando ao leitor alguns
aspectos da cultura pedagógica alemã, e mostra o perfil de um professor pesquisa-
dor que consegue traduzir formativamente, para as novas gerações de estudantes,
a importância de estudar os clássicos. De sua ocupação de décadas com dois gran-
des pensadores da tradição pedagógica ocidental, resulta uma visão aprofundada
de aspectos nucleares da educação. Sua interpretação de Rousseau permite res-
gatar o sentido originário emancipador inerente à Bildung alemã, uma vez que o
genebrino apresentou a compreensão crítica da condição humana em sua histori-
cidade e sua sociabilidade, que influenciaram, entre outros, autores como Kant,
Herder, Humboldt e o próprio Herbart. De outra parte, os estudos minuciosos que
Bolle faz de Herbart revelam o sentido formativo inerente ao ensino que serve
como crítica ao reducionismo cada vez mais crescente das questões educacionais
amplas à linguagem da aprendizagem dominada por competências e habilidades.
Em síntese, educandos e educadores encontrarão nesta entrevista muitos impul-
sos teóricos para continuar pensado questões formativas indispensáveis para um
mundo melhor.
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Entrevista
REP: Prof. Dr. Rainer Bolle, poderia nos falar sobre alguns aspectos de sua
biografia: sobre sua infância e seus primeiros estudos? Por que você escolheu a
pedagogia sistemática e a educação como campos de investigação e ocupação pro-
fissional? Quais foram suas influências intelectuais mais importantes?
Prof. Dr. Rainer Bolle: Acredito que sempre tive curiosidade. Eu queria sa-
ber tudo o que era possível. Muitas vezes, coisas que as pessoas preferiam não me
contar, de modo que minha curiosidade não era raramente julgada como irritante.
Subjetivamente, percebo que a minha educação foi bastante rigorosa e sustentada
na obediência e no funcionamento ordenado. Não se tratava de autonomia, pen-
samento independente, questionamento crítico. Eu também não vivenciei isso na
escola. Eu não era um mau aluno e por muito tempo respondi “sim” à pergunta se
eu gostava de ir à escola. Isso pode ter sido o caso no início, mas, já nas 7ª a 10ª
classes, esse não era mais o caso. Isto, no entanto, se alterou novamente devido ao
fato de que, na escola secundária, na 11ª classe, dois anos e meio antes da conclusão
no ensino médio (Abitur), eu mudei novamente de curso e encontrei professores
que, a meu ver, eram de alguma forma mais “humanos”, mais acessíveis e, em
alguns aspectos, também mais “críticos”. Associo minhas mais belas experiências
escolares a este tempo antes da conclusão do ensino médio.
Nessa época, eu queria realmente entrar para a polícia, depois de me formar
no ensino médio. Quem sabe, então, o que teria sido de mim?! Que não tenha che-
gado a isso, devo, na verdade, mais a um amigo que conheci durante esse tempo no
ensino médio, mas que não frequentava a escola. Nos conhecemos porque ele havia
reprovado de ano na escola técnica em sua cidade natal e, portanto, fez um curso
como mecânico de precisão em minha cidade natal. O que meus pais e doze anos
de escola foram menos capazes de fazer, eu experimentei em muitas conversas
sobre Deus e o mundo com ele. Por sugestão dele, comecei a questionar as coisas,
a acertar contas com várias coisas que eu tinha tomado como certas, a reorganizar
completamente minha vida. É claro que isto não aconteceu de um dia para o outro,
mas certamente foi muito mais rápido então do que se tivesse que acontecer hoje,
em uma idade avançada. Um dos resultados deste enfrentamento na época, auxi-
liado por outros eventos, foi que eu não entrei para a polícia e, em vez disso, me
formei como professor.
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No início, a reivindicação pedagógica associada a ela ainda não estava tanto
em primeiro plano. Eu havia escolhido as disciplinas de “Teologia Católica” e “Fi-
losofia”, e, acima de tudo, a teologia era meu principal interesse. Eu poderia ter
acabado me tornando um padre se não tivesse encontrado uma namorada pouco
tempo depois, que não gostou nada da ideia e me convenceu a casar e ter filhos.
Tudo isso foi então ainda durante o tempo da universidade, onde houve um grande
ceticismo, pelo menos na casa de meus pais, de que aqui provavelmente a ordem
correta não foi mantida. Porque se determinava: primeiro estudar, depois garantir
um emprego e finalmente seria a hora de começar uma família. Talvez não seja sem
importância mencionar que não cumpri esta ordem, ainda mais em um momento
em que foi feito o anúncio claro de que, após a formatura, ainda seria possível fazer
um estágio, mas não mais na profissão de professor. Houve um congelamento das
admissões nas escolas. Hoje, com tal perspectiva, quase todos provavelmente inter-
romperiam seu curso de formação de professor e fariam outra coisa, porque estudar
como mero meio não pode mais cumprir seu propósito. Comigo foi diferente! Mas de
longe não só comigo. Naquela época, não houve êxodo em massa do curso de forma-
ção de professores. O estudo foi também um fim em si mesmo, um lugar de debate,
de liberdade, como eu nunca havia experimentado antes, uma oportunidade para
uma verdadeira formação.
É assim que eu classificaria isso hoje. Minha nova situação familiar – tornei-
-me pai pela primeira vez aos 20 anos e pela segunda vez aos 22 – até encorajou-me
a me concentrar mais na pedagogia. Porque aqui, também, havia muito “trabalho”.
Escolhi então a pedagogia como um segundo tema. A filosofia tornou-se, assim,
o terceiro tema. Mas, de alguma forma, essa inclinação se alargou junto com a
necessidade de olhar para as conexões entre as áreas de conhecimento. No final –
depois de conhecer, nesse caminho, Dietrich Benner –, isto levou ao tema da minha
dissertação sobre Educação Religiosa e Ética na Prússia, que era principalmente
sobre o processamento de conexões e tensões entre teologia, educação, ética e po-
lítica. O doutorado também me deu a oportunidade de conciliar pelo menos dois
anos de licença da profissão docente. Depois disso, tive a sorte de conseguir ime-
diatamente um cargo de assistente universitário na Universidade de Hamburgo.
A posição estava focada na educação religiosa, mas ao mesmo tempo me ofereceu
a oportunidade de me habilitar na educação geral. Esse foi então meu trabalho em
J. J. Rousseau. E, após meu tempo como assistente, a situação de contratação na
escola encontrou um período mais favorável, e nesse meio fui para Hamburgo, para
participar da seleção, e imediatamente assumi como professor. Minha escola era
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uma escola particular católica em Hamburgo. Lá, é claro, eu ensinava principal-
mente religião, mas eu também tive a oportunidade de ensinar filosofia e até peda-
gogia no ensino médio, que normalmente não é uma disciplina no ensino médio, de
uma escola geral em Hamburgo. Com a chamada para a Pädagogische Hochschule
Karlsruhe, em julho de 2002, terminou meu tempo na Escola Sophie Barat, em
Hamburgo.
REP: Um interesse de sua variada e ampla trajetória intelectual é sempre a
educação em uma perspectiva clássica. Nesse contexto, você já lidou com vários au-
tores. O que você pensa sobre o papel dos clássicos na educação das novas gerações?
Prof. Dr. Rainer Bolle: Já apresentei sobre os antecedentes biográficos que
me levaram à pedagogia. O fato de os clássicos terem sido capazes de assumir
um papel particularmente importante do meu interesse pela pedagogia se deve,
naturalmente, a vários fatores. Pessoalmente, a impressão que Dietrich Benner e
Herwig Blankertz deixaram em mim, durante meus estudos, certamente desem-
penhou um papel importante. Os clássicos puderam ganhar importância crescente
para mim, quando ficou claro que, na fase decisiva da transição para a sociedade
burguesa do século XVIII para o XIX, eles fizeram a seguinte pergunta e a res-
ponderam de forma construtiva e bastante coerente: o que significa, para o modo
como nos ocupamos com as novas gerações, se elas não devem ser simplesmente
treinadas para atender padrões sociais pré-definidos, mas ser educadas para a
autonomia, para a livre, auto e codeterminação e para a responsabilidade social?
Enquanto a pesquisa empírico-analítica, que hoje domina a ciência educacio-
nal, tem a tendência de querer apenas determinar o que parece estar acontecendo
na educação, sem poder esclarecer teórica e coerentemente a partir da mera prá-
tica o que deve ser feito em seu lugar, a pedagogia clássica criou pelo menos bases
importantes para isso, para poder pensar sobre essas questões repetidamente, no
sentido de uma solução construtiva. Os clássicos não nos dizem simplesmente, em
termos concretos, o que devemos fazer, mas nos encorajam a sermos capazes de
perceber o que é pedagogicamente decisivo e, com base nisso, obter uma orientação
em termos de teoria da ação quando assumimos responsabilidade pedagógica.
REP: Você trabalhou intensamente com o pensamento de Jean-Jacques Rous-
seau e também escreveu um livro importante sobre ele. Qual é o seu interesse nes-
te autor? O que você considera central no conceito de educação de Rousseau? Como
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você interpreta o princípio da perfectibilidade humana através da educação de
Rousseau?
Prof. Dr. Rainer Bolle: Tenho dedicado bastante tempo de minha vida aos
escritos de Rousseau. Originalmente, o tema da perfectibilidade humana através
da Educação era mais amplo. Vários rascunhos clássicos deveriam ser discutidos
aqui. Eu queria começar com Rousseau, mas depois quanto mais eu olhava para
suas obras completas, mais ele ficava comigo. Fiquei fascinado acima de tudo pela
imensidão de seu círculo de pensamento. Muitos têm considerado Rousseau como
um autor contraditório, mas a maioria dessas contradições poderia ser bem trata-
das histórica e hermeneuticamente - se fosse possível classificá-las em termos de
história de vida e colocá-la em conexão com o respectivo círculo de destinatários.
Na terceira edição de meu escrito de habilitação (BOLLE, 2002), que não foi
publicada por acaso no ano de Rousseau 2012 (300º aniversário, 250 anos do Emile
e Contrato Social), substituí o termo Erziehungsbegriff no título pelo termo Edu-
ktion. Este termo não deve ser confundido com o conceito de educação, que tem
seu equivalente em inglês, francês, espanhol e português, que é sempre traduzido
para o alemão como Erziehung. A Eduktion, por outro lado, é em princípio um novo
termo e deve ser distinguida da educação (Erziehung). O pano de fundo disto é que
os dois termos pedagógicos básicos tradicionais em alemão, Bildung e Erziehung,
desempenham um papel diferente na história da emancipação burguesa. Embora
o conceito de formação (Bildung) em sua tradição do neo-humanismo não possa ser
traduzido de forma adequada para outra língua, por outro lado, sua orientação é
fundamentalmente emancipatória. A formação liberta o homem para si mesmo e o
conecta com a “humanidade”.
O conceito de educação, por outro lado, tem uma história mais longa, que é
bastante ambivalente. O termo educação tem sido frequentemente mal utiliza-
do e continua a ser mal utilizado diariamente, com o sentido de treinar pessoas,
para “puxá-las” para caminhos pré-determinados, para, simplesmente, adaptá-las
acriticamente às diretrizes da sociedade, para transformar adolescentes em meros
objetos de educação. E, em minha percepção, o próprio conceito de educação não
se defende o suficiente contra este abuso, parece justificar aqueles que o utilizam
desta forma. Consequentemente, a “educação” é usada com tanta frequência e em
quase todos os lugares. Parece que não se pode evitar...
Os clássicos da pedagogia têm uma compreensão diferente da educação, uma
compreensão que inclui o adolescente em seu desenvolvimento, leva-o à responsa-
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bilidade e não simplesmente exerce uma determinação sobre ele. Mas os clássicos
não mudaram o termo e, portanto, deve-se ter um interesse quase filosófico na
questão da educação, deve-se ser capaz de lidar de forma muito crítica com a prá-
tica educacional convencional, para poder detectar as diferenças – com o mesmo
conceito – com precisão.
Meu orientador de doutorado, Dietrich Benner, fala aqui da distinção entre
educação “afirmativa” e “não afirmativa”. Preferi, então, falar de Eduktion ao invés
de “educação não afirmativa” e deixar o termo Erziehung para aqueles que querem
“puxar” seus filhos em uma direção muito específica, de acordo com determinadas
normas, que não levam a criança à autonomia, mas praticam a tutela permanente.
A Eduktion, por outro lado, não deriva da palavra latina educare, mas de edu-
cere ou exducere, que significa conduzir para fora. Aqui, estou preocupado com um
“ato de libertação” ou “caminho de libertação” dos “grilhões da infância” para a edu-
cação. A educação está, portanto, “levando à educação”, à educação no sentido mais
abrangente possível. A associação de “liderança” está orientada para a alegoria de
Platão sobre a caverna, que enfatiza particularmente o aspecto da libertação.
É precisamente este tipo de compreensão de educação que tenho notado nos
clássicos da pedagogia, embora, como eu disse, eles não falavam de Eduktion, mas,
precisamente, de Erziehung; Rousseau falou então de éducation. Até agora, porém,
ainda não consegui me afirmar com meu novo conceito.
É claro que, apesar de toda a diferenciação conceitual, tenho o problema que
meus colegas muitas vezes chamam a si mesmos de pesquisadores da educação e,
ao fazerem isso – e que também é o que eles de fato fazem! – estão mais preocupa-
dos academicamente com a problemática da má condução da ação pedagógica do
que com as possibilidades e perspectivas alternativas da pedagogia clássica.
Meu livro de Rousseau, em sua terceira edição, ofereceu-me assim a oportuni-
dade de incorporar meu entendimento sobre educação na interpretação da pedago-
gia de Rousseau.
Com relação ao problema da perfectibilidade, é digno de nota que Rousseau,
como autor do pensamento francês, não possui o termo alemão Bildung, mas ele
usa, em vez disso, de forma muito específica, o conceito de capacidade de perfecti-
bilidade, que em alemão pode ser traduzido como Vervollkommnungsfähigkeit, que
em certos aspectos também está muito próximo do conceito alemão de formação.
E o ponto aqui é que Rousseau, no seu Segundo Discurso, identifica esta perfecti-
bilidade, juntamente com a liberdade, como características essenciais da natureza
humana. Assim, a supressão não só da liberdade, mas também da capacidade de
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se aperfeiçoar é, ao mesmo tempo, a supressão do humano. Esta supressão des-
creve assim um caminho de autoalienação. E isto poderia ter, ao mesmo tempo,
o possível efeito colateral de mostrar também que é contra a natureza humana
deixar-se reprimir. E só por esta razão não devemos ficar tão surpresos se os cha-
mados representantes e especialistas da “educação” falham tão frequentemente
com exatamente esta educação, alcançando exatamente algo diferente do que eles
realmente queriam alcançar.
REP: Você também trabalhou intensamente com o pensamento de Johann
Friedrich Herbart, que também é um clássico no campo da teoria e filosofia da
educação. No momento, você é o presidente da Sociedade Internacional Herbart e
está no processo de organização da conferência sobre Herbart, que será realizada
na Universidade de Budapeste. Por que Herbart se tornou um clássico e qual seria
sua atualidade? O que significa ensino educativo (erziende Unterricht) em Herbart
e de que forma é um conceito crítico contra a pedagogia da competência? Você pode
nos dizer algo sobre a Sociedade Internacional Herbart e suas publicações?
Prof. Dr. Rainer Bolle: Estou envolvido com Rousseau desde aproximada-
mente 1980 e com Herbart desde 1983. Embora eu estivesse entusiasmado com
Rousseau desde o início, demorou um pouco mais com Herbart. Meu primeiro ponto
de contato foi a psicologia de Herbart, depois a pedagogia e a filosofia prática. Ape-
sar de minha participação na publicação de uma edição resumida da pedagogia do
jovem Herbart por Dietrich Benner, Herbart ainda não era de interesse principal
durante a época de minha tese (1985-1988). Na fase da habilitação, ele no mínimo
ajudou a me levar a um outro pensamento de Rousseau, a trazer este para um
ponto melhor.
Há uma expressão proferida pelo neokantiano Paul Natorp afirmando que
Herbart foi o melhor pedagogo entre os filósofos e o maior filósofo entre os pedago-
gos. Isto diz muito e não quero contradizê-lo, como se eu pudesse apresentar um
contraexemplo. Talvez outros possam. Meu entusiasmo por Herbart basicamente
só começou com a fase de docência na universidade, na qual eu retomei a maior
parte de seus escritos de forma ainda mais completa e abrangente. Em 2006 – 200
anos da pedagogia geral de Herbart –, tentei abrir um simpósio de Herbart em
Karlsruhe, mas tive que o cancelar devido à falta de inscrições. Um efeito colateral
desta ação foi, no entanto, porque havia um grande número de oradores, que a
publicação planejada ainda pode ter lugar (BOLLE; WEIGAND, 2007). Um segun-
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do efeito colateral importante foi o contato que fiz com a Sociedade Internacional
Herbart (Internationale Herbart Gesellschaft). No mesmo ano, tornei-me membro.
Em 2015, consegui trazer a conferência bienal da sociedade para a Pädagogische
Hochschule Karlsruhe. Desde então, fiz parte da diretoria e, em 2017, fui eleito
presidente em Paris.
Este ano, a reunião está programada para acontecer em Budapeste. Na ver-
dade, já deveria ter acontecido lá em março, mas teve que ser adiada para o outono
por causa da crise da pandemia da Covid-19. Talvez tenhamos que adiar nova-
mente até a primavera de 2022. A própria diretoria é, grosso modo, responsável
pela coordenação geral dos membros da associação. Mas o trabalho de organização
decisivo é feito pelos responsáveis no local, que também são sempre membros da
associação.
A resposta à pergunta por que Herbart pode ser corretamente chamado de
um clássico da pedagogia, já indiquei em um primeiro passo com minha referência
ao julgamento de Natorp. Herbart está entre os que cumprem os critérios de ter
concebido uma pedagogia não afirmativa, conseguindo fazer isso muito sistemati-
camente. Também é bem-sucedido na integração da ética e da psicologia, que, ao
contrário de muitas outras psicologias, já foi desenvolvida em um contexto educa-
cional e, portanto, pode justificadamente ser chamada de psicologia educacional.
O campo geral de sua pedagogia do tato pedagógico à instrução educativa e sua
formação de caráter orientado à moral são tão versáteis que respondem à maioria
dos problemas e questões pedagógicas atuais e que podem ser extraídos de sua pe-
dagogia. Uma característica especial de sua pedagogia, para a qual existem poucos
pontos de referência na pedagogia cotidiana de hoje, desde a família até a escola, é
seu conceito de instrução educativa (Erziehenden Unterrichts).
No pensamento empírico-analítico dominante da pesquisa em ciências edu-
cacionais, descobriu-se que os professores nas escolas de hoje têm cinco tarefas:
planejar, ensinar, aconselhar, educar, inovar. Não há muito a ser dito contra estas
tarefas, exceto que sua inter-relação parece ser completamente obscura, parecendo
refletir também que não há coerência para os praticantes. Isto é bem diferente em
Herbart. Ele só queria reconhecer o ensino que, ao mesmo tempo, educa, ou seja,
de um ensino que é formativo. Isto é concebível quando os processos educacionais
podem ser relacionados à instrução, porque a instrução não apenas forma um cír-
culo de pensamento, mas, dentro da estrutura deste círculo de pensamento, que
segue um interesse multifacetado, forma o poder crítico de julgamento, ao qual a
educação pode então responder em forma e conteúdo. No pensamento analítico, ao
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invés disso, tais processos são isolados uns dos outros, não têm nada a ver uns com
os outros, e cada ato pedagógico isolado começa assim aproximadamente do zero,
porque não pode pressupor nada.
Este pensamento analítico, no qual as partes individuais são isoladas e enu-
meradas, mas não podem mais ser reunidas, também inclui a lógica da competên-
cia. Qualquer classicista poderia ter entendido o conceito de competência com base
em sua competência linguística com conhecimentos latinos. Mas ninguém usou
este termo. A principal razão pode ser que a lógica da competência isola tudo que
se supõe ser capaz de fazer e saber – e o faz com a intenção de poder avaliar os
detalhes isolados. As competências são formuladas de tal forma que são, acima
de tudo, verificáveis. Isto não corresponde às prioridades do conceito de educação.
A educação quer, acima de tudo, levar a pessoa educadora a si mesma e além de
si mesma. A educação serve ao ser humano, as competências devem atender aos
padrões estabelecidos.
Eu já mencionei que a Sociedade Internacional Herbart se reúne a cada dois
anos em um local diferente para um simpósio. Há um tema de conferência. O tema
da conferência para Budapeste, por exemplo, é “Personalidade – Caráter – Mo-
ralidade”. A partir deste tema, a conferência e o foco são estruturados, a partir
daqui são convidados os palestrantes, os quais são, muitas vezes, mas nem sempre,
seus próprios membros. A principal publicação da Sociedade Internacional Herbart
neste contexto é o volume bienal do simpósio, que em princípio documenta as con-
tribuições dos conferencistas.4
REP: Você é professor na universidade há muito tempo, trabalhando com a
disciplina Pedagogia Geral. O que significa ser um professor em uma universidade
alemã? O que significa Pedagogia Geral e por que tal disciplina é parte especial da
tradição pedagógica alemã? Por que a pedagogia e a teoria educacional precisam
de Pedagogia Geral? Como professor no ensino superior, como você julga a sempre
nova geração de estudantes? Em que estão interessados os estudantes alemães e o
que eles pensam dos clássicos e das humanidades?
Prof. Dr. Rainer Bolle: A questão sobre o que significa ser professor em uma
universidade alemã não é tão fácil de responder quanto é colocada. No mínimo,
ser professor em uma universidade alemã é uma profissão bastante livre, embora
exatamente o que distinguiu esta profissão por muitos anos pareça estar gradual-
mente evaporando, especialmente nos últimos anos e décadas. A burocratização
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está avançando e a liberdade de ensino e pesquisa está sendo cada vez mais res-
trita ou regulamentada. Entre todos os funcionários da universidade, entretanto,
o professor ainda é o mais livre, pois ainda lhe é permitido tomar muitas decisões
em relação ao seu trabalho, decisões que de outra forma são ainda mais fortemente
regulamentadas.
O que na verdade é a Pedagogia Geral também deve ser tratado com um pouco
mais de detalhe. A Pedagogia Geral difere das pedagogias especiais, que se referem
a uma área específica, antes de tudo, porque a Pedagogia Geral é geral em um
triplo sentido: 1) refere-se a todas as pessoas; 2) refere-se a todas as áreas da vida
para todas as pessoas; 3) neste sentido, combina a educação humana geral com o
objetivo comum a todos: autonomia com independência e responsabilidade social.
Neste sentido, a Pedagogia Geral também é pedagogia no verdadeiro sentido
da palavra, porque leva em conta, simultaneamente, o que é realmente a pedago-
gia. Com todas as pedagogias parciais, não seria apenas necessário ver se elas são
coerentes em si mesmas e, sobretudo, se têm alguma coisa a ver com a pedagogia
no sentido descrito acima.
Aqueles que se distanciam do contexto geral através do pensamento analítico,
como as pedagogias da área às vezes fazem, naturalmente também têm maiores
dificuldades não apenas em encontrar seu próprio centro, mas também em iden-
tificar seu próprio pensamento e agir como pedagogos em primeiro lugar, pois isto
é fundamentalmente caracterizado como pensamento e atuação holística. Como já
mostrei por meio de várias sinalizações, o pensamento pedagógico geral está em
muitos aspectos em desacordo com a corrente dominante das prioridades atuais,
também em termos pedagógicos.
Portanto, não é evidente que os estudantes desenvolvam uma grande afeição
pela pedagogia clássica. Uma vez que dei uma palestra introdutória aos professo-
res do primeiro ano do último semestre de inverno pela primeira vez desde 2011,
tenho pelo menos a este respeito uma melhor visão do último semestre dos estudos,
que confrontei com vários textos de pedagogia clássica. A resposta foi bastante sa-
tisfatória, embora provavelmente sejam os melhores estudantes os que são os mais
beneficiados por este confronto.
REP: Você também examina intensivamente os problemas escolares e a for-
mação como investigação e tarefas da vida. Como é a escola alemã após a Decla-
ração de Bolonha? O que você considera serem os problemas centrais nas escolas
de hoje? Quais são as principais dificuldades para o trabalho dos professores na
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escola? O que você considera crucial para os professores formadores? Ainda existe
uma orientação crítica em relação aos professores formadores a ser mantida? O que
poderia ser criticado neste contexto?
Prof. Dr. Rainer Bolle: Escrevi alguns ensaios críticos sobre a falta de apoio
aos processos formativos nas escolas. O conteúdo do argumento, ou seja, o conteúdo
das aulas tem um papel muito subordinado. Eles são tratados a curto prazo, são
importantes até o próximo teste, até o próximo exame, e depois são esquecidos
novamente. Entretanto, este fenômeno tem sido denunciado desde o século XVII,
na medida em que, do ponto de vista da teoria educacional, a escola pública não
cumpre a tarefa que lhe é realmente destinada. Este não é, portanto, um problema
específico da Declaração de Bolonha. É também o resultado de uma contradição na
sociedade burguesa, que a escola não só tem uma tarefa educacional, mas também
é um instrumento de qualificação social. E esta última tarefa é mais bem com-
preendida pelos estudantes, pelos pais e, em última instância, infelizmente, pelos
pais do que a atividade educacional. Para a maioria, a escola e o ensino são um
meio para atingir um fim. O final são os certificados, o diploma escolar, que é um
pré-requisito para certas posições sociais.
Tenho certeza de que a maioria dos professores percebe que algo está errado
com a relação entre a escola e os alunos, mas não acho que eles a analisem da
maneira como se poderia analisar. Porque assim eles poderiam notar ainda melhor
que responsabilidade eles mesmos têm no problema e, talvez, soubessem em que
estrutura e em que medida eles mesmos poderiam contribuir para resolver o pro-
blema, pelo menos mitigar o efeito.
REP: É preocupante como o conservadorismo autoritário e o obscurantismo
estão gradualmente ganhando espaço. Como você entende esses fenômenos e por
que isso está acontecendo? Qual seria o papel da educação pública e da pedagogia
contra o autoritarismo crescente?
Prof. Dr. Rainer Bolle: Tais fenômenos, estruturas autoritárias e efeitos an-
tiesclarecedores não chegaram ao meu conhecimento tão claramente quanto desde o
início da crise da Covid-19, apesar das minhas críticas expressas às escolas até 2019.
Com algumas pinceladas de caneta, as portarias estão sendo usadas aqui para
anular não apenas as leis, mas os direitos fundamentais. A imprensa, o rádio e a
televisão parecem ter conhecido quase apenas um tema durante anos e anos, vo-
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zes críticas são imediatamente abafadas e interditadas com um rigor não visto há
muito tempo. A responsabilidade pessoal, que até há pouco tempo era considerada
garantida, pelo menos em termos de saúde, não parece mais desempenhar um
papel importante. O fato de que no passado as pessoas, com sua responsabilidade
pessoal, às vezes tomavam decisões erradas que eram aceitas sem mais sanções,
agora não é mais tolerado.
Portanto, tudo isso mudou muito significativamente em um curto espaço de
tempo. E a questão da exatidão com que isso acontece, a facilidade com que gran-
des massas de pessoas se deixam levar à sua própria ruína por um medo sistema-
ticamente fomentado – isso é bastante assustador! E, infelizmente, pelo menos
para mim, não é reconhecível o que poderia parar este processo a partir de dentro
de forma tão simples. Os vírus já existem desde antes do início da humanidade. A
humanidade sempre viveu com isso e sobreviveu. Os seres humanos sempre mor-
reram, mas alguns sempre morreram como resultado de uma infecção pelo vírus.
Os vírus sempre sofreram mutações...
A falta de história com a qual as pessoas se percebem e o mundo é certamente
favorecida pelo progresso científico e técnico, que distrai a história, obscurece as
conexões históricas ou as faz esquecer, mas é também um problema educacional.
E também o problema raramente se mostra tão claramente como na crise da Co-
vid-19, cujo fim – assim parece no momento – provavelmente só pode ser esperado
com o fim das mutações do vírus.
REP: O diagnóstico dos tempos: qual é sua avaliação dos principais proble-
mas mundiais atuais, tais como Covid-19, pobreza, miséria, fome, insalubridade,
injustiça social, etc.? Qual é o papel da democracia e da educação pública neste
contexto?
Prof. Dr. Rainer Bolle: O que também é surpreendente em toda a crise da
Covid-19 é que quase todos os Estados do mundo não pararam ou interromperam
o efeito dominó da crise, como se apertasse um botão, e que os mecanismos que
fomentaram e continuam a fomentar isto ainda não foram desvendados. Desta
forma, a maior parte das pessoas, ou seja, a maioria da humanidade ainda está
convencida, ou pelo menos parece estar, de que o preço horrendo pago até agora
pela pandemia nos planos social, econômico, psicológico, dos direitos de liberdade,
etc., ainda evitou um mal muito maior e deve, portanto, continuar até que os vírus
sejam finalmente “derrotados”.
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As escolas estão sendo intimidadas de semana a semana com novas medidas
e regulamentos. Todos concordam de alguma forma com isso. Aqueles que desis-
tem colhem sanções, mas estas só são aceitas porque não são as sanções de um
sistema injusto, mas porque são as sanções de um sistema legal que tem o bem
da humanidade em mente para sua justificação e, portanto, é claro, deve proteger
a humanidade de seus ameaçadores. A humanidade pode estar sendo salva neste
momento, mas as pessoas estão presas.
REP: Em conclusão, o que você sugeriria para professores e alunos (professo-
res e alunos também) em termos de educação humana em relação a este diagnós-
tico de época?
Prof. Dr. Rainer Bolle: A estas últimas palavras, um pouco amargas, ca-
beria também uma amarga conclusão. E isso certamente se encaixa na crise da
Covid-19, mas não me convence em absoluto. Talvez haja vida após a crise, e talvez
tudo o que foi possível e aceito por tantas pessoas com alguns golpes de mão, em
sua óbvia desvantagem, acabe levando à reflexão e à autorreflexão crítica. Isto
poderia então ser também um começo da educação, cuja necessidade a crise revelou
mais uma vez...
Notas
1 Os interessados que desejarem maiores informações sobre a referida sociedade poderão fazê-lo por meio do
seguinte site: https://www.herbart-gesellschaft.de
2 Enquanto Klaus Prange organizou o volume Herbart und Dewey (2014), Rotraud Coriand e Alexandra
Schotte (2014) organizaram o volume “Einheimische Begriff” und Disziplinentwicklung, ambos inseridos
na Coleção Herbartstudien, publicada pela Edition Paideia.
3 Cabe referenciar aqui os vários volumes da Coleção Herbartstudien, da qual também fazem parte os dois
volumes citados na nota anterior.
4 Os volumes são publicados na Coleção Herbartstudien, conforme já referido em nota anterior.
Referências
BOLLE, Reiner. Jean-Jacques Rousseau: Das Prinzip der Vervollkommnung des Menschen
durch Erziehung und die Frage nach dem Zusammenhang von Freiheit, Glück und Identität. 3.
ed. Münster: Waxmann Verlag Gmbh, 2002.
BOLLE, Reiner; WEIGAND, Gabriele (Hrgs.). Johann Friedrich Herbart 1806-2006: 200 Jah-
ren Allgemeiner Pädagogik Wirkungsgeschitliche Impulse. Münster; New York; München; Ber-
lin: Waxmann, 2007.
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CORIAND, Rotraud; SCHOTTE, Alexandra (Hrsg.). “Eiheimische Begriffe” und Disziplinent-
wicklung. Jena: Garamond Verlag – Edition Paideia, 2014.
INTERNATIONALE HERBART GESSELLSCHAFT. Disponível em: https://www.herbart-ge-
sellschaft.de/. Acesso em: 24 ago. 2021.
PRANGE, Klaus (Hg.). Herbart und Dewey. Pädagogische Paradigmen im Vergleich. Jena: Ga-
ramond Verlag – Edition Paideia, 2014.
ROUSSEAU, Jean-Jacques. Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os
homens. Tradução de Lourdes Santos Machado. 4. ed. São Paulo: Nova Cultura, 1988. v. 2. (Os
Pensadores).