
Jaqueline Moll, Angelo Vitório Cenci, Telmo Marcon
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v. 29, n. 3, Passo Fundo, p. 986-995, set./dez. 2022 | Disponível em www.upf.br/seer/index.php/rep
REP — Em linhas gerais, como descreverias sua trajetória como educadora-pesquisa-
dora no âmbito do debate educacional brasileiro?
Jaqueline Moll (JM) — Agradeço, em primeiro lugar, o convite para dizer minha pa-
lavra nessa revista tão importante para a educação brasileira que vem de uma longa
história e de uma longa tradição no debate democrático. Eu, nesse ano de 2023, com-
pleto 40 anos de vida na educação pública. Com 18 anos comecei como professora
primária. Foi importante recuperar isso no meu memorial para professora titular na
URGS onde abordei exatamente o que vou contar aqui agora rapidamente. Eu me
torno professora aos 18 anos. Tinha feito várias experiências de pré-estágio, fiz o curso
normal, na época de ensino médio, segundo grau. A minha vida como educadora e
pesquisadora nasce da perplexidade com a diferença que havia entre a escola privada e
a escola pública. Eu tinha estudado e comecei a atuar como professora na educação
básica, primeiro ano do ensino fundamental, no segundo ano do ensino fundamental,
no terceiro ano do ensino fundamental e, também, trabalhei no quarto ano do ensino
fundamental. Tinha experiências variadas e fortes que nasceram da perplexidade frente
às condições de vida das crianças na escola privada e as crianças na escola pública. Já
no meu estágio no curso normal, mas também nos pré estágios, esse mergulho na rea-
lidade da escola pública foi me mostrando que havia ali uma diferença que não era dada
pela capacidade das crianças. Anos mais tarde através das leituras de Maria Helena
Souza Patto, já fazendo o mestrado, em 1987, vou entender toda essa visão psicologi-
zante, biologizante, que vai culpabilizando as crianças e as famílias de que eles são
pessoas com menos capacidade. Ao contrário, eram crianças ávidas por conhecer temas,
livros, literatura, mas a limitação do ambiente, dos professores e da vida delas é que
impunha um obstáculo quase intransponível. Eu acho importante recuperar isso por-
que eu vou me fazendo e me tornando professora e pesquisadora pela perplexidade que
eu enxergo como normalista, nos pré estágios, nos estágios. Eu vou trabalhar numa
escola privada e reacendo todas as minhas memórias. Eu fiz o ensino médio numa es-
cola pública, mas o fundamental eu fiz numa escola católica na minha cidade. Era uma
escola de irmãs franciscanas porque eu sou de uma família que tem duas tias que são
irmãs franciscanas, uma delas ainda vive em Passo Fundo na comunidade franciscana
de Maria Auxiliadora, a irmã Maria Estelita Tonial, mestra de noviças. Eu vim dessa
tradição. A minha família fez um grande esforço e eu estudei nessa escola. Então a
diferença era muito grande nos materiais, na sala de aula, na formação dos professores,
nas relações, bem como, no trato com as pessoas e o desrespeito que eu assistia na escola
pública em relação às crianças e o que eu vivia na escola pública era algo que eu jamais