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v. 29, n. 3, Passo Fundo, p. 746-751, set./dez. 2022 | Disponível em www.upf.br/seer/index.php/rep
Com a instauração da República, em 1889, a Educação não ganha, efetivamente,
centralidade. Enquanto vários países, tendo a França como referência, definem a edu-
cação como dever do Estado Republicano, laica e gratuita, no Brasil vive-se, ao longo
do século XX uma tensão entre a educação privada (confessional) e a educação pública.
Essa tensão transversaliza o processo constituinte de 1987-1988 e desemboca no texto
Constitucional com uma síntese precária, mas traduzindo o que foi possível. Conforme
refere o artigo 206 da Carta, a educação é dever do Estado e da família. A LDB, de
1996, reafirma essa premissa, mas inverte a ordem: a educação é dever da família e do
Estado. Qual é o problema de fundo? Um deles é o de que não chegamos a um mínimo
de consenso no Brasil sobre de quem é o dever de educar e, consequentemente, de
assegurar o direito à educação. Essa definição não suficientemente objetiva de quem é
o dever para com a Educação abre espaços para o avanço de grupos com interesses
estritamente empresariais, a expansão de escolas cívico-militares e, em 2022, com o PL
1.338/2022, a aprovação do projeto de educação domiciliar. Tais situações afrontam
os princípios básicos de uma educação republicana, tais como obrigatoriedade, laici-
dade e gratuidade.
Essas breves considerações históricas justificam a importância de pautar o tema
da educação domiciliar e o direito à educação. No entanto, outras razões de ordem
psicosociológica são fundamentais de serem postas. A constituição da personalidade e
a preparação para a vida em sociedade exigem a presença do outro. Inúmeros autores
argumentam em defesa de uma socialização significativa, especialmente para as crian-
ças. Privá-las de experiências múltiplas, que só podem ocorrer em espaços públicos, ou
seja, na convivência social, pode acarretar consequências de múltiplas naturezas. Nesse
aspecto reside o problema central que precisa ser posto para fundamentar uma crítica
à educação domiciliar. É na convivência com o diverso que aprendemos a apreciar o
quanto de riqueza as relações podem propiciar. Evidente que a convivência com o outro
pode gerar problemas e conflitos, mas dali derivam as possibilidades de crescimento,
aprendizagens e trocas significativas. Onde predomina realidades homogeneizantes a
tendência é de maior adequação, ou seja, de menos desafios colocados às crianças e
adolescentes e, pois, de processos de socialização mais heteronomizantes.
Entre os grandes desafios a serem enfrentados para a sustentação democrática nas
sociedades contemporâneas está o da formação para a democracia. Essa formação tem
formulações teóricas, mas precisa ocorrer na prática, ou seja, na convivência com outras
pessoas que pensam e tem pontos de vista distintos. A formação para um a convivência
na pluralidade, própria de toda sociedade complexa e democrática, passa pelo lento e,
por vezes, conflitivo, coletivo e necessário, processo de aprendizagem de compartilhar