
Educação, justiça e empoderamento
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v. 26, n. 3, Passo Fundo, p. 657-675, set./dez. 2019 | Disponível em www.upf.br/seer/index.php/rep
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ESPAÇO PEDAGÓGICO
estrita igualdade perante a lei, pois só assim se respeita o Estado de direito, the
rule of law, e, com ele, as regras que organizam a competição entre os indivíduos.
Ao reavaliar em novos termos, e com outra intencionalidade, o discurso sobre
a justiça, o neoliberalismo também reavaliou o discurso sobre a igualdade, mas
não no sentido de uma “igualdade de posições” (DUBET, 2010, p. 9) cujo objetivo
ou finalidade é, segundo esse autor (2010, p. 99), “reduzir a distância entre rendi-
mentos e condições de vida”, ou, o que é o mesmo, as diferenças de posicionamento
na estrutura social. Orientou-se, isso sim, pela igualdade de oportunidades e, mes-
mo aqui, tão-somente pela “igualdade legal de oportunidades” (ROSANVALLON,
2011, p. 334), isto é, pela igualdade interpretada em termos meramente formais
ou jurídicos, o que implica instaurar, onde quer que se aplique, um “sistema de
oportunidades formalmente igualitário” (NACHTWEY, 2017, p. 89), contribuindo,
portanto, para invisibilizar um sem número de vantagens e privilégios que distor-
cem a competição social por oportunidades, especialmente as que proporcionam
melhores condições de vida boa.
Significa isso que, juridicamente, todos têm os mesmos direitos de acesso às
posições sociais vantajosas e não, como sublinha J. Rawls (1999, p. 62), que “todos
deverão ter uma possibilidade razoável de as atingir”. Este é o sentido de uma “jus-
ta igualdade de oportunidades” (RAWLS, 1999, p. 57) que os neoliberais rasuram
da sua representação da sociedade, da sua concepção ou modelo de justiça, como se
as circunstâncias de partida não contassem para nada, como se a sociedade onde
nascem os indivíduos, num tempo fortemente marcado pelo “capitalismo patrimo-
nial” (PIKETTY, 2014, p. 523), não os destinasse, ora aberta ora subtilmente, a lu-
gares manifestamente desiguais em recursos, benefícios, poder e reconhecimento.
Mesmo imperando a igualdade formal, como tanto apregoam os aficionados da ne-
oliberalização, isso não impede que “os que possuem menos capital cultural fiquem
parados, enquanto os melhores situados à partida consigam êxitos” (NACHTWEY,
2017, p. 13). Justificar estes últimos com o talento e o esforço, isto é, com o mérito
(ROSANVALLON, 2011, p. 314), é lançar uma cortina de fumo sobre privilégios,
recursos e vantagens que sempre se afiguraram essenciais ao aproveitamento das
melhores oportunidades.
Mais além de seu intrínseco formalismo, essa concepção de justiça enquan-
to igualdade legal de oportunidades é também individualista, pois remete para a
responsabilidade única, exclusiva, do ator social na conquista das oportunidades
apetecidas ou desejadas (tudo depende, portanto, da sua implicação, do seu envol-
vimento, das suas escolhas, das suas decisões), e deixa ainda transparecer, na sua